Falava-se com sisudez de política; Maria era muito regeneradora.
E todas essas noites, Tancredo lá estava, indolente e belo, desenhando alguma flor para ela bordar, ou tangendo à guitarra canções populares de Nápoles. Todos ali o adoravam; mas ninguém mais que o velho Monforte, que passava horas, enterrado na sua alta gravata, contemplando o Príncipe com enternecimento. Depois, de repente, erguia-se, atravessava a sala, ia-se debruçar sobre ele, palpá-lo, senti-lo, respirá-lo, murmurando no seu francês de embarcadiço:
- Ça aler bien... Hein? Beaucoup bien... Ora estimo...
E estas correntes bruscas de afecto comunicavam-se decerto, porque nesse momento Maria tinha sempre um dos seus lindos sorrisos para o papá ou vinha beijá-lo na testa.
De dia ocupava-se de coisas serias. Organizara uma útil associação de caridade, a Obra pia dos cobertores, com o fim de fazer no inverno às famílias necessitadas distribuições de agasalhos; e presidia no salão de Arroios, com uma campainha, as reuniões em que se elaboravam os estatutos. Visitava os pobres. Ia também amiudadas vezes a uma devoção às Igrejas, toda vestida de preto, a pé, com um véu muito espesso no rosto.
O esplendor da sua beleza aparecia agora velado por uma sombra tocante de ternura grave: a Deusa idealizava-se em Madona; e não era raro ouvi-la de repente suspirar sem razão.
Ao mesmo tempo a sua paixão pela filha crescia. Tinha então dois anos e estava realmente adorável; vinha todas as noites um momento à sala, vestida com um luxo de princesa; e as exclamações, os êxtases de Tancredo não findavam! Fizera-lhe o retrato a carvão, a esfuminho, a aquarela; ajoelhava-se para lhe beijar a mãozinha cor-de-rosa, como ao bambino sagrado. E Maria, agora, apesar dos protestos de Pedro, dormia sempre com ela entre os braços.
Ao começo desse setembro o velho Monforte partiu para os Pirenéus. Maria chorou, dependurada do pescoço do velho, como se ele largasse de novo para as travessias de África.