Os Maias - Cap. 13: Capítulo 13 Pág. 369 / 630

E de resto se não pudessem habitar, conjuntas na mesma cidade, as pessoas entre as quais tivesse havido atritos desagradáveis, as sociedades humanas tinham de se desfazer...

Alencar não respondeu, caminhando ao lado de Carlos, com a cabeça baixa. Depois parou de novo, franzindo a testa:

- Outra coisa em que te quero falar. Houve entre ti e o Dâmaso alguma pega? Eu pergunto-te isto porque noutro dia, lá em casa dos Cohens, ele veio com uns ditos, umas insinuações... Eu declarei-lhe logo: «Dâmaso, Carlos da Maia, filho de Pedro da Maia, é como se fosse meu irmão.» E o Dâmaso calou-se... Calou-se, porque me conhece, e sabe que eu nestas coisas de lealdade e de coração sou uma fera!

Carlos disse simplesmente:

- Não, não há nada, não sei nada... Nem sequer tenho visto o Dâmaso.

- Pois é verdade, continuou Alencar tomando o braço de Carlos, lembrei-me muito de ti em Sintra. Até fiz lá uma coisita que me não saiu má, e que te dediquei... Um simples soneto, uma paisagem, um quadrozinho de Sintra ao pôr-do-sol. Quis provar aí a esses da Ideia Nova, que, sendo necessário, também por cá se sabe cinzelar o verso moderno e dar o traço realista. Ora espera aí, eu te digo, se me lembrar. A coisa chama-se - Na estrada dos Capuchos...

Tinham parado à esquina do Seixas; e o poeta tossira já de leve, antes de recitar, - quando justamente lhes apareceu o Ega, vindo de baixo, vestido de campo, com uma bela rosa branca no jaquetão de flanela azul.

Alencar e ele não se encontravam desde a fatal soirée dos Cohens. E ao passo que o Ega conservava um ressentimento feroz contra o poeta vendo nele o inventor dessa pérfida lenda da «carta obscena» - Alencar odiava-o pela certeza secreta de que ele fora o amante amado da sua divina Rachel. Ambos se fizeram pálidos; o aperto de mão que deram foi incerto e regelado; e ficaram calados, todos três, enquanto Ega nervoso levava uma eternidade a acender o charuto no lume de Carlos. Mas foi ele que falou, por entre uma fumaça, afectando uma superioridade amável:

- Acho-te com boa cor, Alencar!





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