Alencar não respondeu, caminhando ao lado de Carlos, com a cabeça baixa. Depois parou de novo, franzindo a testa:
- Outra coisa em que te quero falar. Houve entre ti e o Dâmaso alguma pega? Eu pergunto-te isto porque noutro dia, lá em casa dos Cohens, ele veio com uns ditos, umas insinuações... Eu declarei-lhe logo: «Dâmaso, Carlos da Maia, filho de Pedro da Maia, é como se fosse meu irmão.» E o Dâmaso calou-se... Calou-se, porque me conhece, e sabe que eu nestas coisas de lealdade e de coração sou uma fera!
Carlos disse simplesmente:
- Não, não há nada, não sei nada... Nem sequer tenho visto o Dâmaso.
- Pois é verdade, continuou Alencar tomando o braço de Carlos, lembrei-me muito de ti em Sintra. Até fiz lá uma coisita que me não saiu má, e que te dediquei... Um simples soneto, uma paisagem, um quadrozinho de Sintra ao pôr-do-sol. Quis provar aí a esses da Ideia Nova, que, sendo necessário, também por cá se sabe cinzelar o verso moderno e dar o traço realista. Ora espera aí, eu te digo, se me lembrar. A coisa chama-se - Na estrada dos Capuchos...
Tinham parado à esquina do Seixas; e o poeta tossira já de leve, antes de recitar, - quando justamente lhes apareceu o Ega, vindo de baixo, vestido de campo, com uma bela rosa branca no jaquetão de flanela azul.
Alencar e ele não se encontravam desde a fatal soirée dos Cohens. E ao passo que o Ega conservava um ressentimento feroz contra o poeta vendo nele o inventor dessa pérfida lenda da «carta obscena» - Alencar odiava-o pela certeza secreta de que ele fora o amante amado da sua divina Rachel. Ambos se fizeram pálidos; o aperto de mão que deram foi incerto e regelado; e ficaram calados, todos três, enquanto Ega nervoso levava uma eternidade a acender o charuto no lume de Carlos. Mas foi ele que falou, por entre uma fumaça, afectando uma superioridade amável:
- Acho-te com boa cor, Alencar!