Depois, no silêncio estofado da sala, a sua voz ergueu-se dolente e tremula:
- Tens razão, acabou-se! Tu não me acreditas, tudo se acabou!... É melhor que te vás embora... Ninguém me torna a acreditar... Acabou tudo para mim, não tenho ninguém mais no mundo... Amanhã saio daqui, deixo-te tudo... hás de me dar tempo para arranjar...
Depois, que hei de fazer, vou-me embora!
E não pôde mais, tombou para o chão, com os braços estirados, perdida de choro.
Carlos voltou-se, ferido no coração. Com o seu vestido escuro, para ali caída e abandonada, parecia já uma pobre criatura, arremessada para fora de todo o lar, sozinha a um canto, entre a inclemência do mundo... Então respeitos humanos, orgulho, dignidade humana, tudo nele foi levado como por um grande vento de piedade. Viu só, ofuscando todas as fragilidades, a sua beleza, a sua dor, a sua alma sublimemente amante. Um delírio generoso, de grandiosa bondade, misturou-se à sua paixão. E, debruçando-se, disse-lhe baixo, com os braços abertos:
- Maria, queres casar comigo?
Ela ergueu a cabeça, sem compreender, com os olhos desvairados. Mas Carlos tinha os braços abertos; e estava esperando para a fechar dentro deles outra vez, como sua e para sempre... Então levantou-se, tropeçando nos vestidos, veio cair sobre o peito dele, cobrindo-o de beijos, entre soluços e risos, tonta, num deslumbramento:
- Casar contigo, contigo? Oh Carlos... E viver sempre, sempre contigo?... Oh meu amor, meu amor! E tratar de ti, e servir-te, e adorar-te, e ser só tua? E a pobre Rosa também... Não, não cases comigo, não é possível, não valho nada! Mas se tu queres, porque não?... Vamos para longe, juntos, e Rosa e eu sobre o teu coração! E hás de ser nosso amigo, meu e dela, que não temos ninguém no mundo... Oh! meu Deus, meu Deus!...
Empalideceu, escorregando pesadamente entre os braços dele, desmaiada: e os seus longos cabelos desprendidos rojavam o chão, tocados pelas luz de tons de ouro.