E justamente Cruges, depois de bater dois acordes bruscos, arredara o mocho, esgueirava-se do estrado, enxugando as mãos ao lenço. Aqui e além algumas palmas ressoaram, moles e de cortesia, entre um grande murmúrio de alívio.
E o Ega e Carlos correram à porta, onde já esperavam o marquês, o Craft, o Taveira - para abraçar, consolar o pobre Cruges que tremia todo, com os olhos esgazeados.
E imediatamente, no silêncio atento que predominava, um sujeito muito magro, muito alto, surgiu no tablado, com um manuscrito na mão. alguém ao lado do Ega disse que era o Prata, que ia falar sobre o Estado agrícola da província do Minho. Atrás, um criado veio colocar sobre a mesa um candelabro de duas velas: o Prata, de ilharga para a luz, mergulhou no caderno: e dentre o perfil triste e as folhas largas um rumor lento foi escorrendo, rumor de reza numa sonolência de novena, onde por vezes destacavam como gemidos - «riqueza dos gados..., esfacelamento da propriedade..., fértil e desprotegida região...»
Começou então uma debandada sorrateira e formigueira, que nem os chuts do comissário do sarau, vigilante e de pé sobre um degrau do estrado, podiam conter. Só as senhoras ficavam; e um ou outro burocrata idoso, que se inclinava zelosamente para o murmúrio de reza, com a mão em concha sobre a orelha.
Ega, que fugia também «ao vicejante paraíso do Minho», achou-se em frente do Sr. Guimarães.
- Que maçada, hein?
O democrata concordou que aquele preopinante não lhe parecia divertido... Depois, mais sério, com outra ideia, segurando um botão da casaca do Ega:
- Eu espero que V. Ex.ª há pouco não ficasse com a impressão de que eu sou solidário ou me importo com meu sobrinho...
Oh! decerto que não! Ega vira bem que o Sr. Guimarães não tinha pelo Dâmaso nenhum entusiasmo de família.
- Asco, senhor, só asco! Quando ele foi a primeira vez a Paris, e soube que eu morava numa trapeira, nunca me procurou! Porque aquele imbecil dá-se ares de aristocrata... E como V. Ex.ª sabe, é filho de um agiota!