- Eu?
- Você, que é o procurador da casa!
Que havia ali, senão uma questão de filiação, portanto de legítima? A quem pertenciam esses detalhes legais senão ao procurador?
Vilaça murmurou com todo o sangue na face:
- Homem, o amigo mete-me numa!...
Não. Ega metia-o apenas naquilo em que o Vilaça, como procurador, logicamente e profissionalmente devia estar.
O outro protestou, tão perturbado que gaguejava. Que diabo! Não era esquivar-se aos seus deveres! Mas é que ele não sabia nada! Que podia dizer ao Sr. Carlos da Maia? «O amigo Ega veio-me contar isto, que lhe contou um tal Guimarães ontem à noite no Loreto...» Não tinha a dizer mais nada...
- Pois diga isso.
O outro encarou Ega com olhos que chamejavam:
- Diga isso, diga isso... Que diabo, senhor, é necessário ter topete!
Deu um puxão desesperado ao colete, foi bufando até ao fundo do cubículo, onde esbarrou com o armário. Voltou, tornou a encarar o Ega:
- Não se vai a um homem com uma coisa dessas sem provas... Onde estão as provas?...
- Ó Vilaça, desculpe, você está obtuso!... A que vim eu aqui senão trazer-lhe as provas, as que há, boas ou más, a história do Guimarães, essa caixa com os papeis da Monforte?...
Vilaça, que resmungava, foi examinar a caixa, virando-a nas mãos, decifrando o mote do sinete Pro amore.
- Então, abrimo-la?
Já Ega puxara uma cadeira para a mesa. Vilaça cortou o papel, gasto nos cantos, que envolvia o cofre. E apareceu efectivamente uma velha caixa de charutos pregada com duas taxas, cheia de papeis, alguns em maços apertados por fitas, outros soltos dentro de sobrescritos abertos que tinham o monograma da Monforte sob uma coroa de marquês. Ega desembrulhou o primeiro maço. Eram cartas em alemão, que ele não percebia, datadas de Buda-Pesth e de Carlsruhe.
- Bem, isto não nos diz nada... Adiante!
Outro embrulho, a que Vilaça cuidadosamente desapertou o nó cor de rosa, resguardava uma caixa oval com a miniatura de um homem de bigodes e suíças ruivas, entalado na alta gola dourada de uma farda branca.