Os Maias - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 630 / 630

Já avistavam o Aterro, a sua longa fila de luzes. De repente Carlos teve um largo gesto de contrariedade:

- Que ferro! E eu que vinha desde Paris com este apetite! Esqueci-me de mandar fazer hoje para o jantar um grande prato de paio com ervilhas.

E agora já era tarde, lembrou Ega. Então Carlos, até aí esquecido em memórias do passado e sínteses da existência, pareceu ter inesperadamente consciência da noite que caíra, dos candeeiros acesos. A um bico de gás tirou o relógio. Eram seis e um quarto!

- Oh, diabo!... E eu que disse ao Vilaça e aos rapazes para estarem no Bragança pontualmente às seis! Não aparecer por aí uma tipoia!...

- Espera! exclamou Ega. Lá vem um «americano», ainda o apanhamos.

- Ainda o apanhamos!

Os dois amigos lançaram o passo, largamente. E Carlos, que arrojara o charuto, ia dizendo na aragem fina e fria que lhes cortava a face:

- Que raiva ter esquecido o paiozinho! Enfim, acabou-se. Ao menos assentamos a teoria definitiva da existência. Com efeito, não vale a pena fazer um esforço, correr com ânsia para coisa alguma...

Ega, ao lado, ajuntava, ofegante, atirando as pernas magras:

- Nem para o amor, nem para a glória, nem para o dinheiro, nem para o poder...

A lanterna vermelha do «americano», ao longe, no escuro, parara. E foi em Carlos e em João da Ega uma esperança, outro esforço:

- Ainda o apanhamos!

- Ainda o apanhamos!

De novo a lanterna deslizou, e fugiu. Então, para apanhar o «americano», os dois amigos romperam a correr desesperadamente pela rampa de Santos e pelo Aterro, sob a primeira claridade do luar que subia.

FIM





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