O Processo - Cap. 8: Capítulo 8 Pág. 133 / 183

«Oh!, peço desculpa.», volveu o homem, baixando a cabeça para se mirar à luz da vela, como se ainda se não tivesse apercebido da figura em que se encontrava. «A Leni é sua amante?», inquiriu K. apressadamente. De pernas levemente afasto das, segurava o chapéu nas m aos, que cruzara atrás das costas. O facto de envergar um pesado casacão fê-lo revestir-se de um ar de certa superioridade em relação ao pobre homenzinho. «Oh!, meu Deus», disse o homem horrorizado, colocando uma mão em frente ao rosto, «não, não, o que é que pensa de mim?» «O senhor tem aspecto de um homem honesto», volveu K. sorrindo, «mas, de qualquer maneira, venha dai.» Fez com o chapéu um gesto para que ele fosse à frente dele. «Como se chama?», perguntou K à medida que iam andando. «Block, e sou comerciante», respondeu-lhe o homenzinho, voltando-se para se apresentar, mas K. não permitiu que ele parasse. «Esse é o seu nome verdadeiro?», continuou K «E claro que é., foi a resposta. «Por que é que duvida?» «Pensei que o senhor tivesse algum motivo para o ocultar», disse K. Sentia-se agora à vontade, tão à vontade como uma pessoa se sente ao falar para uma criatura inferior num pais estrangeiro, nada dizendo a seu próprio respeito, discutindo calmamente o que interessa ao outro, o que lhe atribui importância pela atenção que lhe dispensa, ainda que disso se possa desligar se quiser. Quando chegaram à porta do escritório do advogado, K. parou, abriu a porta e chamou o homem, que avançava humildemente pelo corredor: «Não é preciso tanta pressa, alumie aqui." K. pensou que Leni estivesse escondida no escritório; obrigou o comerciante a alumiar todos os recantos, mas a sala estava vazia. Em frente do retrato do juiz, K. agarrou o homem pelos suspensórios e puxou-o para trás. «Sabes quem ele é?», perguntou, apontando para cima, em direcção ao retrato. O homem levantou a vela para iluminar o retrato e respondeu: «É um juiz.» «Um juiz de elevada categoria?», perguntou K., ficando ao lado do outro para observar a impressão que o retrato lhe causava. O homem ergueu os olhos com veneração, dizendo: «É um juiz de elevada categoria. «Vê-se bem que o senhor não tem muito poder de observação», disse K. «É, entre os juízes de instrução, o de categoria mais baixa.» «Agora me recordo», volveu o homem, deixando a vela apagar-se, «Já antes me disseram isso.» «Pois com certeza», gritou K, «como é que eu me esqueci, é claro que já lhe disseram isso.» «Mas porquê, por que razão?», perguntou o homem, caminhando em direcção à porta, visto que K o estava a empurrar de trás.





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