«Suspeito do que certamente quer dizer», retorquiu K. afavelmente. «Certamente ouviu falar do meu processo.» «É exactamente isso», respondeu o tio, acenando com a cabeça e assumindo um ar grave, «ouvi falar do teu processo.» «Mas a quem é que ouviu?», indagou K. «A Erna escreveu-me a esse respeito», disse seu tio. «Ela não te vê muitas vezes, bem sei, e tu também não lhe prestas muita atenção, lamento ter de te dizer, contudo, ouviu falar disso. Recebi a carta dela esta manhã e é claro que apanhei o primeiro comboio para aqui. Não havia qualquer outra razão para vir, mas esta, parece-me, é mais do que suficiente. Posso ler-te a passagem da carta a teu respeito.» Tirou a carta da sua saca. «Aqui está ela. Diz assim: 'Há muito tempo que não vejo o Joseph. Fui na semana passada ao Banco, mas o Joseph estava tão ocupado que não consegui falar-lhe Esperei cerca de uma hora mas tive de me vir embora por ter a seguir uma lição de piano. Gostaria imenso de lhe falar; pode ser que tenha brevemente uma oportunidade. Ele enviou-me uma enorme caixa de chocolates pelos meus anos, o que foi muito amável da sua parte. Esqueci-me de lhe escrever na altura a agradecer-lhe e foi só quando me perguntou por ele que me lembrei Pois terei de lhe dizer que os chocolates desaparecem imediatamente neste internato, isto é, uma pessoa mal se apercebe de que foi presenteada com uma caixa de chocolates e já esta desapareceu. Mas, voltando ao Joseph, há uma coisa que acho que lhe devo dizer. Como lhe contei, não consegui vê-lo quando fui ao Banco, porque ele se encontrava ocupado a atender um senhor. Depois de ter estado à espera, humildemente, durante um bocado, perguntei a um continuo se aquela entrevista demoraria ainda muito tempo. Respondeu-me que era muito provável que demorasse porque lhe parecia que ela se relacionava com o processo que tinha sido levantado ao gerente. Perguntei a que processo se referia e se ele não estaria equivocado, ao que respondeu que não estava e que havia efectivamente um processo, e muito sério, mas que não sabia mais nada acerca dele Ele próprio gostaria de ajudar Herr K, visto que este era um homem bom e justo, mas não sabia como faze-lo e só desejava que alguém influente defendesse bem os interesses do senhor gerente. Estava certo de que isto aconteceria e tudo teria um 60m desfecho, mas, entretanto, como podia ver pelo estado de espírito de Herr K, as coisas pareciam ir mais do que bem. Naturalmente que não levei tudo isto demasiadamente a sério, tentando tranquilizar o Em do continuo e proibi-lo de falar do assunto a qualquer outra pessoa, uma vez que estava certa de que se tratava de simples tagarelice.
