Um desses gestos - o braço estendido, a palma em vertical – era característico dos indianos. Certo dia um embrulho de charutos, que podíamos comprar a baixo preço naquela época, foi roubado de minha cama. Sem pensar no que fazia, dei parte disso ao oficial e um dos velhacos de que já falei apresentou-se prontamente e disse, faltando de todo à verdade, que vinte e cinco pesetas foram roubadas de sua cama. Por algum motivo que ignoro o oficial resolveu, ali mesmo, que o rapaz moreno devia ser o ladrão. Havia rigor contra o roubo na milícia, e em teoria os ladrões podiam ser fuzilados. O pobre rapaz deixou-se levar para a casa da guarda para ser revistado, e o que mais me impressionou foi que ele mal procurou protestar sua inocência. No fatalismo de sua atitude podia-se perceber a pobreza desesperada em que fora criado. O oficial ordenou-lhe que se despisse. Com humildade que, para mim, foi horrível, ele se pôs nu e suas roupas foram revistadas. Está claro que nem os charutos, nem o dinheiro, foram encontrados ali, e na verdade ele não os roubara. O mais penoso de tudo é que ele não pareceu menos envergonhado depois de ficar esclarecida sua inocência. Aquela noite levei-o ao cinema e lhe dei brandy e chocolate, mas tudo aquilo foi horrível demais, isto é, a tentativa de apagar um insulto com dinheiro.
Por alguns minutos eu quase acreditara que ele fosse ladrão, e isso não podia ser apagado.
Pois bem, algumas semanas depois, no front, tive problemas com um dos homens em minha seção. A essa altura eu era "cabo", no comando de doze homens. Estávamos em guerra estática, fazia um frio terrível, e o trabalho principal estava em colocar sentinelas nos postos e fazer com que permanecessem acordadas. Certo dia um homem recusou-se a ir para determinado posto, dizendo muito acertadamente que ali estaria exposto ao fogo do inimigo. Era uma criatura franzina, e eu o agarrei e comecei a arrastá-lo para lá. Isso fez despertar os sentimentos dos outros contra mim, pois os espanhóis, ao que penso, são mais sensíveis ao toque do que nós, os ingleses. No mesmo instante fui cercado por homens a gritar: "Fascista! Seu fascista! Solte o rapaz! Isto não é um exército burguês! Seu fascista!", etc. etc. Tão bem quanto pude, em meu espanhol muito ruim, gritei também que as ordens tinham de ser obedecidas, e a briga se transformou num daqueles debates prolongados por meio dos quais a disciplina é gradualmente implantada nos exércitos revolucionários. Alguns diziam que eu tinha razão, outros que eu estava errado, mas o fato é que quem mais ardorosamente me defendeu foi o rapaz moreno. Assim que viu o que ocorria, entrou no meio dos outros e começou a defender-me calorosamente.