Uma manhã, encontravam-se então em Pelly, na hora dá atrelar, Dolly, que era uma paz de alma, de repente, enraiveceu. Começou por um longo e dilacerante uivo de lobo, que a todos arrepiou, atirando-se em seguida a Buck. Este, que nunca vira um cão enraivecido e nem motivos tinha para recear a raiva, pressentiu logo que estava perante algo de horrível, desatando a fugir, apavorado. A correr sem destino, levava Dolly logo atrás, arfante e a esfumar; e nem ela o alcançava, tão grande era o terror dele, nem ele se conseguia livrar dela, tal era a loucura que a arrastava. Embrenhando-se no coração da floresta da ilha, escapuliu-se depois por um dos lados em declive, atravessou um acidentado canal coberto de gelo, de onde passou para outra ilha, alcançou uma terceira ilha, voltou para trás, para o rio principal, e, desesperado, dispôs-se a atravessá-lo. E durante todo este tempo, embora não se atrevesse a olhar para trás, ouvia-a rosnar mesmo junto a si. François, que se encontrava à distancia de um quarto de milha, chamou por ele, que imediatamente retrocedeu, conservando sempre aquele pequeno avanço, mas arquejante e respirando com dificuldade, enquanto punha em François a esperança derradeira de salvação. O condutor já tinha a machada preparada, e quando Buck passou por ele, como um tiro, descarregou-a na cabeça da cadela raivosa.
Buck, exausto e lutando por respirar, cambaleou de encontro ao trenó, completamente perdido, desamparado. Era esta a oportunidade de Spitz. Pulou para cima de Buck e por duas vezes cravou os dentes na vítima indefesa, rasgando e estraçalhando a carne até ao osso. Foi então que o chicote de François se fez ouvir e Buck teve a satisfação de ver Spitz apanhar a maior sova que alguma vez foi administrada a um cão de matilha.
— É um demónio, esse Spitz — comentou Perrault. — Um dia destes, ainda dá cabo de Buck.
— Pois sim, mas Buck vale por dois demónios — foi a réplica de François — Tenho reparado bastante nele e estou certo disso.
