Vezes sem conta tentou atingir a garganta alva como a neve, onde a vida palpitava mesmo à superfície, mas de todas as vezes Spitz o golpeava e fugia. Buck fingia, então, atirar-se à garganta, enquanto, erguendo de súbito a cabeça e afastando-a para o lado, se arremessava com todo o seu peso de encontro a Spitz, como se fora um maço para o derrubar. Porém, em vez disso, era a espádua de Buck que de todas as vezes recebia mais um golpe, enquanto Spitz se punha rapidamente a salvo.
Spitz continuava incólume, enquanto Buck escorria sangue por todos os lados e respirava com dificuldade. A luta estava a tornar-se desesperada. E, durante todo este tempo, silenciosos, os lobos, em círculo, aguardavam o momento de acabar com o primeiro que caísse. Quando Buck se encontrava quase sem fôlego, foi a altura de Spitz começar as investidas, obrigando-o a recuar, vacilante. De uma das vezes, Buck caiu, e logo todo o circulo de sessenta cães se ergueu; conseguiu, porém, equilibrar-se a meio da queda, e o círculo tornou a baixar-se, ficando a espera.
Mas Buck possuía uma qualidade apreciável que podia levar a grandes coisas — a imaginação. Lutava por instinto, mas também sabia lutar com a cabeça. Lançou-se pelo ar, como que a tentar o velho truque das espáduas, mas no último minuto Foi a rasar a neve e, mergulhando nela, cravou os dentes na mão esquerda de Spitz. Ouviu-se um estalido de osso a partir-se, e o cão branco enfrentou-o sobre trás paras. Buck tentou por trás vezes derrubá-lo e, repetindo o mesmo truque, partiu-lhe a mão direita. Apesar da dor e da incapacidade de se suster nas paras, Spitz lutava furiosamente para se aguentar. Viu circulo silencioso dos cães, com os olhos a brilharem, as línguas pendentes e os bafos prateados a elevarem-se no ar, fechar-se sobre ele, exactamente como vira outros círculos semelhantes, no passado, fecharem-se sobre os seus antagonistas derrotados. Só que, desta vez, o vencido era ele.
