Adorava descer em corrida os leitos secos dos ribeiros e, agachado, espiar a vida dos pássaros nos bosques. Era capaz de passar um dia inteiro escondido na vegetação, donde podia observar as perdizes a debicarem no solo e a pavonearem-se para cá e para lá. Mas acima de tudo gostava de correr ao luar nas noites de Verão, escutando os murmúrios abafados e sonolentos da floresta, decifrando os sinais e os sons como quem lê um livro, e procurando essa coisa misteriosa, que constantemente chamava por ele, estivesse ele a dormir ou acordado.
Uma noite acordou sobressaltado, os olhos esgazeados, as ventas palpitantes e farejando o ar, a juba eriçando-se-lhe em ondas sucessivas. Da floresta chegava até ele o apelo (ou uma nota dele, pois o apelo era multissonante), distinto e definido como nunca anteriormente — um uivo prolongado, igual, e no entanto diferente, ao de qualquer cão-lobo. E ele reconheceu-o, com aquela familiaridade antiga, como um som já antes ouvido por ele. Atravessou o acampamento adormecido e sem um ruído embrenhou-se na floresta. Próximo do grito, abrandou a marcha e passou a avançar cautelosamente, até chegar a uma clareira entre as árvores, e, olhando, viu na sua frente, erecto sobre os quadris, focinho apontado ao céu, um enorme e seco lobo cinzento.
Não fizera qualquer ruído, mas o lobo parou de uivar e tentou captar a sua presença. Buck, pé ante pé, entrou na clareira, meio agachado, o corpo tenso, a cauda hirta e pisando o solo com desusado cuidado. Cada movimento anunciava ao mesmo tempo a ameaça e o convite à amizade. Era a trégua ameaçadora que caracteriza os encontros das feras na caça. O lobo, porém, ao vê-lo, fugiu. Buck seguiu-o, em saltos loucos, na ânsia de o alcançar. Conduziu-o para uma ribanceira sem saída, no leito da enseada, onde troncos amontoados lhe barravam o caminho.
O lobo voltou-se, girando sobre as paras, à maneira de Joe e de todos os cães-lobos acuados, rosnando e de pêlo eriçado, batendo os dentes numa contínua e rápida sucessão de estalos.
