Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 3: III Pág. 108 / 273

Da semente maligna da luxúria, tinham brotado todos os outros pecados mortais: orgulho em si mesmo e desprezo pelos outros, cupidez no uso do dinheiro para a aquisição de prazeres ilícitos, inveja daqueles cujos vícios não podia alcançar e murmurações caluniosas contra os piedosos, gula no prazer da comida, a ira sombria e ameaçadora que o invadia no meio do seu desejo, o pântano da preguiça espiritual e corporal em que todo o seu ser se havia atolado.

Enquanto se mantinha sentado na sua carteira, olhando calmamente para o rosto astuto e austero do reitor, a sua mente dava voltas às curiosas questões que lhe ia pondo. Se um homem tivesse roubado uma libra na sua juventude e tivesse usado essa libra para juntar uma enorme fortuna, quanto seria ele obrigado a devolver: apenas a libra que roubara ou a libra acrescida dos juros compostos, ou toda a sua imensa fortuna? Se um leigo, ao dar o baptismo, espargisse a criança com a água antes de pronunciar as palavras, a criança ficaria baptizada? Seria válido o baptismo com água mineral? Como é possível que, enquanto a primeira bem-aventurança promete o reino dos céus aos pobres em espírito, a segunda bem-aventurança prometa também aos humildes que eles possuirão a terra? Porque seria o sacramento da eucaristia instituído sob as duas formas, do pão e do vinho, se Jesus Cristo está presente em corpo e sangue, alma e divindade, só no pão e só no vinho? Uma minúscula partícula da hóstia consagrada contém todo o corpo e todo o sangue de Jesus Cristo, ou apenas uma parte do seu corpo e do seu sangue? Se o vinho se transformar em vinagre e a hóstia se esfarelar e decompuser depois de terem sido consagrados, Jesus Cristo continuará presente nas duas substâncias, como Deus e como homem?

- Ele vem aí! Ele vem aí!

Um rapaz, do seu posto junto da janela, tinha visto o reitor sair de casa.





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