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Capítulo 3: III

Página 114
Ámen.

Quando seguia a pé para casa, entre companheiros silenciosos, um espesso nevoeiro parecia envolver a sua mente. Aguardava, com a mente entorpecida, que ele se levantasse e lhe revelasse o que tinha ocultado. Devorou o jantar com um apetite voraz e, quando a refeição terminou e os pratos engordurados ficaram abandonados sobre a mesa, ergueu-se e foi para a janela, limpando o molho grosso que lhe enchia a boca com a língua e lambendo os lábios. Tinha, pois, descido ao estado de bestialidade dum animal que lambe os beiços depois de comer a presa. Era o fim; e um vago brilho de receio começou a penetrar o nevoeiro da sua mente. Encostou o rosto à vidraça da janela e olhou a rua que escurecia. Passavam figuras, para um lado e para o outro, no meio da luz fraca. Era aquilo a vida. As letras do nome de Dublim pesavam sobre a sua mente, entrechocando-se ferozmente com uma lenta e rude insistência. A sua alma engrossava e transformava-se num compacto pedaço de gordura, mergulhando cada vez mais fundo, com o seu receio sombrio, num crepúsculo negro e ameaçador, enquanto o seu corpo se conservava apático, desprovido de honra, procurando com os seus olhos obscurecidos, impotente, perturbado, humano, um deus bovino que pudesse adorar.

No dia seguinte, veio a morte e o julgamento, despertando lentamente a sua alma do seu desamparado desespero. O vago brilho de receio transformou-se em terror do espírito, quando a voz rouca do pregador lhe insuflou a morte na alma. Sofreu a sua agonia. Sentiu o frio da morte tocar-lhe as extremidades e avançar lentamente em direcção ao coração, o véu da morte cobrir-lhe os olhos, os centros luminosos do cérebro apagarem-se um a um, como lâmpadas, a última transpiração sobre a pele, a impotência dos membros moribundos, a fala a entaramelar-se, a errar e a falhar, o coração a bater cada vez mais debilmente, quase desfalecido, a respiração, a pobre respiração, o pobre e desamparado alento humano, a soluçar e a suspirar, gorgolejando e estertorando na sua garganta.

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Capa do livro Retrato do Artista Quando Jovem
Páginas: 273
Página atual: 114

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I 1
II 57
III 103
IV 156
V 186