Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 3: III Pág. 124 / 273

«Jazem nas trevas exteriores. Porque, não esqueçam, o fogo do Inferno não produz luz. Tal como, por ordem de Deus, o fogo da fornalha da Babilónia perdeu o seu calor mas não a sua luz, também, por ordem de Deus, o fogo do Inferno, embora mantendo a intensidade do seu calor, arde eternamente nas trevas. É uma incessante tempestade de trevas, chamas negras e fumo negro do enxofre a arder, no meio dos quais os corpos se amontoam uns sobre os outros, sem um sopro de ar. De todas as pragas que devastaram a terra dos Faraós, apenas uma, a das trevas, foi considerada horrível. Que nome, então, poderemos dar às trevas do Inferno, que não duram apenas três dias, mas uma eternidade?

«O horror desta prisão estreita e tenebrosa é aumentado pelo seu terrível fedor. Toda a imundície do mundo, todas as lixeiras e cloacas do mundo, segundo nos é dito, para lá escorrerão, como para um imenso esgoto fedorento, quando a terrível conflagração do último dia tiver purgado o mundo. Além disso, o enxofre que lá arde em tão prodigiosa quantidade enche todo o Inferno com o seu fedor insuportável; e os corpos dos próprios condenados exalam um odor tão pestilencial que, como diz São Boaventura, bastaria um deles para infectar o mundo inteiro. O próprio ar deste mundo, esse elemento puro, torna-se fétido e irrespirável quando fica fechado durante longo tempo. Pensai então como será fétido o ar do Inferno. Imaginai um cadáver imundo e putrefacto que tenha jazido, a apodrecer e em decomposição, no seu túmulo, uma massa gelatinosa de corrupção líquida. Imaginai esse cadáver presa das chamas, devorado pelo fogo do enxofre ardente e libertando densos e sufocantes vapores da sua decomposição nauseabunda e repugnante. E imaginai esse fedor revoltante multiplicado um milhão de vezes e novamente um milhão de vezes, libertado pelos milhões e milhões de carcaças fétidas amontoadas nas trevas nauseabundas, um imenso cogumelo humano putrefacto.





Os capítulos deste livro