Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 3: III Pág. 129 / 273

Tal é a linguagem daqueles verdugos implacáveis, palavras de escárnio e de reprovação, de ódio e de repulsa. De repulsa, sim! Porque mesmo eles, os próprios demónios, quando pecaram, cometeram o único pecado que era compatível com as suas naturezas angélicas, uma revolta do intelecto: e até eles, os demónios abjectos, se afastam, revoltados e repugnados, da contemplação daqueles pecados inomináveis com que o homem corrompido ultraja e macula o templo do Espírito Santo, ultrajando-se e maculando-se a si próprio.

«Oh, meus queridos irmãozinhos em Cristo, que nunca nos caiba em sorte ouvir essas palavras! Que nunca seja esse o nosso destino, repito! Peço fervorosamente a Deus que, no último dia do terrível julgamento, nem uma só alma daqueles que hoje se encontram nesta capela esteja entre aquelas miseráveis criaturas a quem o Juiz Supremo ordenará que se afastem da Sua vista, que nenhum de nós escute nos Seus ouvidos a terrível sentença da expulsão: «Afastai-vos de mim, ó condenados, mergulhai no fogo eterno que o Demónio e os seus anjos prepararam para vós!»,

Stephen percorreu a nave da capela com as pernas a tremer e a nuca arrepiada, como se tivesse sido tocado por dedos fantasmagóricos. Subiu a escadaria e seguiu pelo corredor, ao longo de cujas paredes estavam pendurados os sobretudos e os impermeáveis, como malfeitores enforcados, sem cabeça, gotejantes e informes. E, a cada passo, receava já ter morrido, que a sua alma tivesse sido arrancada à bainha do corpo, que estivesse a mergulhar de cabeça no espaço.

Não conseguindo sentir o chão debaixo dos pés, sentou-se pesadamente na sua carteira, abrindo um dos livros ao acaso e mergulhando nele. Todas aquelas palavras lhe eram dirigidas. Era verdade. Deus era todo-poderoso.





Os capítulos deste livro