Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 4: IV Pág. 168 / 273

O padre aguardou a resposta e acrescentou:

- Quero dizer, alguma vez sentiu dentro de si, na sua alma, um desejo de entrar para a nossa ordem? Pense.

- Pensei nisso algumas vezes - disse Stephen.

O padre deixou cair o cordão da persiana e, unindo as mãos, apoiou nelas o queixo, gravemente, comungando consigo próprio.

- Num colégio como este - disse, finalmente -, há sempre um rapaz, ou dois, ou três, que Deus chama à vida religiosa. Esse rapaz distingue-se entre os seus companheiros pela sua piedade, pelo bom exemplo que dá aos outros. É respeitado por eles; é escolhido, talvez, como prefeito pelos membros da sua confraria. E o Stephen tem sido esse rapaz, neste colégio, prefeito da confraria de Nossa Senhora. Talvez seja o rapaz deste colégio que Deus decidiu chamar para Seu serviço.

Uma forte sensação de orgulho, reforçando a gravidade da voz do padre, fez que o coração de Stephen se acelerasse.

- Receber esse chamamento, Stephen - disse o padre -, é a maior honra que Deus Todo-Poderoso pode conceder à um homem. Nenhum rei ou imperador desta terra tem o poder de um sacerdote de Deus. Nenhum anjo ou arcanjo do Céu, nenhum santo, nem mesmo a própria Virgem Maria, possui o poder de um sacerdote de Deus: o poder das chaves, o poder de ligar e desligar dos pecados, o poder do exorcismo, o poder de expulsar das criaturas de Deus os maus espíritos que as dominam; o poder, a autoridade de fazer que o grande Deus dos céus desça ao altar e tome a forma de pão e de vinho. Que terrível poder, Stephen!

Uma chama começou a acender-se de novo nas faces de Stephen ao escutar neste orgulhoso discurso um eco dos seus próprios pensamentos orgulhosos. Quantas vezes se tinha imaginado como um padre, exercendo calma e humildemente o imenso poder que até os anjos e os santos respeitavam! A sua alma apreciara o secreto devaneio sobre este desejo.





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