Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 5: V Pág. 219 / 273

Fê-la saltar duas ou três vezes na mão e depois atirou-a com força contra o chão do beco, exclamando em resposta ao ruído do embate:

-A tua alma!

Stephen permaneceu junto de Lynch até o número de pontos começar a aumentar. Depois agarrou-o pela manga, para o arrastar. Lynch obedeceu, dizendo:

- Partamos asinha, como diria o Cranly. Stephen sorriu a esta alusão.

Voltaram a atravessar o jardim e o vestíbulo, onde o trémulo porteiro pregava um aviso no quadro. Pararam ao fundo das escadas e Stephen tirou do bolso um maço de cigarros, oferecendo-os ao seu companheiro.

- Eu sei que és pobre - disse.

- Vai para o diabo com essa insolência amarela' - respondeu Lynch.

Esta segunda prova da cultura de Lynch fez com que Stephen sorrisse novamente.

- Foi um grande dia para a cultura europeia - disse ele -, aquele em que te decidiste a praguejar em amarelo.

Acenderam os seus cigarros e voltaram à direita. Após uma pausa, Stephen principiou:

- Aristóteles não definiu a piedade ou o terror. Eu sim. Eu acho...

Lynch parou e disse abruptamente:

- Pára! Não quero ouvir! Sinto-me doente. Passei a noite toda a beber com o Horan e o Goggins.

Stephen prosseguiu:

- Piedade é o sentimento que detém o espírito em presença de algo grave e constante no sofrimento humano e o une ao ser humano sofredor. Terror é o sentimento que detém o espírito em presença de algo grave e constante no sofrimento humano e o une à sua causa secreta.

- Repete lá isso - disse Lynch.

Stephen repetiu lentamente as suas definições.

- Uma rapariga meteu-se numa carruagem, há alguns dias - prosseguiu ele -, em Londres. Ia visitar a mãe que já não via há muitos anos. À esquina de uma rua, o eixo de uma carroça estilhaçou o vidro da carruagem, em forma de estrela.





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