Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 5: V Pág. 233 / 273

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- O Hynes não tem miolos. Passou à força de marrar, apenas marrar.

- Não lhe dês ouvidos. Consegue-se ganhar bom dinheiro numa grande cidade comercial.

- Depende da clientela.

- Ego credo ut vita pauperum est simpliciter atrox, simpliciter

sanguinarius atrox, in Liverpoolio.

As vozes deles chegavam aos seus ouvidos como se estivessem muito distantes, numa pulsação interrupta. Ela preparava-se para partir com as companheiras.

O rápido aguaceiro tinha passado, deixando cachos de diamantes suspensos nos arbustos do relvado, onde a terra negra exalava a sua respiração. As elegantes botas das raparigas ressoavam nos degraus da arcada, enquanto elas conversavam alegremente, sem alarido, olhando para as nuvens, segurando as sombrinhas em ângulos convenientes para se protegerem dos últimos pingos de chuva, voltando a fechá-las, segurando recatadamente as saias.

E se ele a tivesse julgado com excessiva severidade? Se a vida dela fosse um simples rosário de horas, uma vida simples e estranha como a de uma ave, alegre de manhã, inquieta durante o dia inteiro, fatigada ao pôr-do-sol? Se o seu coração fosse simples e obstinado como o coração de uma avezinha?

Acordou quando amanhecia. Oh, que música suave! Tinha a alma encharcada de orvalho. Durante o sono, tinham passado pálidas e frias ondas de luz sobre os seus membros adormecidos. Deixou-se ficar imóvel, como se a sua alma jazesse entre águas frescas, consciente de uma música vaga e suave. A sua mente acordava lentamente para a consciência trémula da manhã, uma inspiração matinal. Penetrava nele um espírito, puro como a mais pura água, suave como o orvalho, pungente como a música. Como ele se insuflava suavemente, apaixonadamente, como se os próprios serafins estivessem a respirar sobre ele! A sua alma acordava lentamente, receando acordar por completo.





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