Retrato do Artista Quando Jovem - Cap. 2: II Pág. 96 / 273

- Demos graças a Deus por termos vivido tanto tempo e feito tanto bem.

Stephen viu os três copos erguerem-se do balcão, quando o seu

pai e os dois amigos bebiam à memória do seu passado. Um abismo da fortuna ou do temperamento separava-o deles. A sua mente parecia-lhe mais velha do que a deles; brilhava glacialmente sobre as disputas deles, as suas alegrias e tristezas, como a lua sobre uma terra mais jovem. Não existia nele vida ou juventude como a que havia existido neles. Não conhecera os prazeres da camaradagem nem o vigor de uma rude e máscula saúde, nem a piedade filial. Nada vibrava dentro da sua alma, excepto uma luxúria fria e cruel e destituída de amor. A sua infância estava morta ou perdida e com ela a sua alma capaz de simples alegrias, e ele andava à deriva pela vida como a esfera estéril da Lua.

Estareis vós pálida e fatigada


De subir pelos céus, olhando para a terra,
Vagueando sempre solitária?

Repetiu para si mesmo os versos do fragmento de Shelley. A sua alternância de triste ineficácia humana e amplos ciclos desumanos de actividade gelou-o, e esqueceu o seu próprio sofrimento humano e ineficaz.

A mãe e o irmão de Stephen e um dos seus primos aguardavam-nos à esquina da tranquila Praça Foster, quando ele e o pai subiram os degraus e avançaram por entre as colunas onde desfilava a sentinela dos Highland. Depois de terem atravessado o grande vestíbulo e alcançado o balcão, Stephen apresentou os seus saques sobre o Banco da Irlanda no valor de trinta e três libras; e essas somas, os valores dos seus prémios por trabalhos de exposição e composição literária, foram-lhe rapidamente pagas pelo caixa, em notas e moedas. Guardou-as nos bolsos, com pretensa compostura e teve de esperar que o amistoso caixa, com quem o seu pai se pusera a conversar, lhe apertasse a mão por cima do largo balcão e lhe desejasse uma brilhante carreira na sua vida futura.





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