Parecia que, mesmo no mar, um homem pode ser vítima dos espíritos maus. Senti no meu rosto o hálito dos poderes desconhecidos que traçam os nossos destinos.
Para evitar que o silêncio se prolongasse, perguntei a Burns se tinha escrito à mulher do capitão. Ele sacudiu a cabeça. Não escrevera a ninguém.
Tornou-se bruscamente sombrio. Nunca lhe ocorrera a ideia de escrever. Ocupava-lhe o tempo todo o ter que vigiar constantemente a carga do navio por causa do malandro de um estivador chinês. Burns ofereceu-me, assim, o primeiro fulgor da autêntica alma de imediato que desconfortavelmente morava no interior do seu corpo.
Ficou pensativo e, depois, apressou-se a dizer com uma energia melancólica:
«Sim! O capitão morreu muito próximo do meio-dia. À tarde, passei uma vista de olhos pelos papéis dele. Ao pôr-do-sol, li as últimas orações pela sua alma e rumei a seguir com o navio a norte, trazendo-o para aqui. Eu... meti-o... aqui.»
Deu um murro em cima da mesa.
«Não lhe seria fácil vir sozinho», observei eu. «Mas porque é que não se dirigiu antes para o porto de Singapura?» Vacilou-lhe o olhar. «Era este o porto mais próximo», murmurou sombriamente Burns.
Eu fizera aquela pergunta inocentemente, mas a resposta (a diferença da distância era insignificante), e os seus modos, deram-me a chave da verdade pura e simples. Ele levara o barco para um porto onde esperava ser designado comandante interino do navio, à falta de um oficial com a carta de capitão que pudesse ocupar o lugar de chefia. Singapura, calculara Burns, e muito bem, devia estar cheio de oficiais com carta de capitão.
Mas o seu raciocínio ingénuo não levara em conta o cabo telegráfico que assentava justamente no fundo do golfo para onde ele virara a proa do navio, que imaginava ter salvo da destruição.