Tufão - Cap. 5: V Pág. 85 / 103

Havia sempre fósforos ali - por ordem dele. O camaroteiro tinha recebido havia muito tempo e gravado na mente as instruções do capitão. «Uma caixa... precisamente aí, está a ver? Não demasiado cheia... onde eu possa estender a mão e encontrá-los, camaroteiro. Posso precisar de uma luz de repente. Nunca se sabe a bordo de um navio aquilo de que uma pessoa pode precisar de repente. Não se esqueça.»

E naturalmente pelo seu lado ele teria o cuidado de tornar a colocá-la escrupulosamente no seu lugar. Fê-lo agora, mas antes de retirar a mão ocorreu-lhe que talvez nunca mais tivesse oportunidade de se servir dela. A intensidade do pensamento fê-lo hesitar e por uma infinitésima fracção de segundo os seus dedos voltaram a fechar-se sobre o pequeno objecto como se ele tivesse sido o símbolo desses pequenos hábitos que nos acorrentam à enfadonha rotina da vida. Largou-a finalmente e, deixando-se cair no sofá, pôs-se a ouvir os primeiros sons do vento que voltava.

Ainda não. Ele ouvia apenas a passagem da água, os pesados chapes, os choques surdos das ondas entrecruzadas penetrando no seu navio de todos os lados, mantendo os tombadilhos constantemente inundados.

Mas a quietude do ar era assustadoramente tensa e perigosa, como um ligeiro cabelo segurando uma espada sobre a sua cabeça. Com esta pausa pavorosa a tempestade penetrava as defesas do homem e descolava-lhe os lábios. O capitão falou na sua solidão e na escuridão de breu da cabina, como se estivesse a dirigir-se a outro ser acordado dentro do seu peito.

- Não gostava de perdê-lo - disse a meia-voz. Estava sentado invisível, separado do mar, do seu navio, isolado, como se retirado da própria corrente da sua existência, onde extravagâncias tais como falar consigo mesmo não tinham certamente cabimento.





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