No capítulo de brigas, nada havia que Cala Nague, a velha e sabida cobra negra não soubesse, porque mais de uma vez enfrentara, no seu tempo, o choque do tigre ferido, e, enroscando a tromba mole para a pôr a salvo, com um rápido golpe de foice da cabeça, de seu invento, arremessara de si a fera em pleno salto; derrubara-a e ajoelhara sobre ela com os enormes joelhos, até que a vida se lhe escapava com um hausto e um uivo, e no chão não restava mais que um pastelão felpudo, às listas, para Cala Nague arrastar pelo rabo.
- Sim - disse Tumai Grande, o condutor, filho de Tumai Preto, que o levara à Abissínia, e neto de Tumai dos Elefantes, que o vira apanhar -, não há nada que a cobra negra receie, excepto a mim. Já viu três gerações nossas dar-lhe de comer e tratá-lo, e viverá até ver a quarta.
- Também tem medo de mim - disse Tumai Pequeno, endireitando a estatura de quatro pés, com um trapo apenas sobre o corpo. Tinha dez anos o filho mais velho de Tumai Grande, e, de acordo com o costume, ocuparia um dia, quando crescesse, o lugar do pai no pescoço de Cala Nague e empunharia o pesado aneus de ferro, o aguilhão do elefante, que nas mãos do pai, avô e bisavô, se tornara polido. Sabia o que dizia, pois nascera à sombra de Cala Nague, brincara-lhe com a ponta da tromba antes de saber andar, levara-o a beber logo que o soube, e Cala Nague estava tão longe de sonhar em desobedecer às suas ordenzinhas agudas como em o matar no dia em que Tumai Grande pousou o bebezinho pardo debaixo das presas do paquiderme, ordenando-lhe que saudasse o seu futuro senhor.
- Sim - disse Tumai Pequeno -, tem medo de mim. - E aproximou-se de Cala Nague a grandes passadas, chamou-lhe velho porco gorducho e fez-lhe levantar as patas uma de cada vez.