- Vou - disse Everard King - mostrar-lhe a jóia da minha colecção. Na Europa só existe um segundo espécime, agora que o de Roterdão morreu. É um gato do Brasil.
- Em que é que um gato do Brasil difere dos outros? O meu primo desatou a rir.
- Vai já ver. Tenha a amabilidade de puxar esse taipal e de olhar para o interior.
Fiz como ele dizia. Diante de mim surgiu uma grande sala vazia, lajeada, e cuja parede oposta era iluminada por pequenas janelas gradeadas. No centro, no rasto de ouro criado por um raio de sol, estava deitado um formidável animal, com a dimensão de um tigre, mas de um negro reluzente como o do ébano. Este tigre não passava de um gigantesco gato preto, em muito bom estado, que se enovelava na luz e se aquecia assim à maneira dos gatos. Era ao mesmo tempo tão musculoso e tão ágil, com uma graça felina tão perfeitamente diabólica que não consegui desviar a vista dele.
- Ora bem - perguntou-me o meu anfitrião com entusiasmo -, que pensa disto? Viu alguma vez um animal mais magnífico?
- Nunca, na verdade. É a elegância e o vigor na harmonia das formas.
- Alguns qualificam-no, erradamente, de puma preto.
Mede perto de três metros da cauda à cabeça. Há quatro anos era um novelo de crina preta com dois olhos amarelos. Foi-me vendido como recém-nascido na região selvagem das nascentes do Rio Negro. A mãe tinha morto doze homens quando acabaram com ela a golpes de lança.
- É, portanto, uma espécie particularmente feroz?
- A mais pérfida, a mais alterada de sangue que existe ao cimo da terra; fale num gato do Brasil a um índio da região alta e vê-lo-á dar um salto. A sua caça preferida é o homem. O marau que ali está ignora por enquanto o sabor do sangue quente: se vier a conhecê-lo será terrível.