Ao dizer isto, abriu a porta, para minha grande surpresa, e, tendo-a logo voltado a fechar nas suas costas, entrou na sala. Ao som da sua voz, a enorme e ágil criatura levantou-se, bocejou, foi esfregar contra ele a grande cabeça escura:
King acariciou-a com a mão.
- Vamos, Tommy! - ordenou. - Vamos, para a jaula!
O gato, afastando-se às arrecuas, foi enroscar-se num canto, debaixo de uma grade.
Everard King saiu, pegou na manivela de ferro, rodou-a; vi a fila de varões do corredor pôr-se em movimento através de uma fenda da grade e constituir com ela uma autêntica jaula. Feito isto, King reabriu a porta e convidou-me a penetrar na sala, cuja atmosfera estava saturada com aquele mau cheiro acre que os grandes carnívoros exalam.
- Compreende a manobra - disse ele. - De dia damos-lhe para seu recreio a largura da sala; depois, à noite, reintegramo-lo na jaula. Podemos, do corredor, fazê-lo sair de lá girando a manivela e, como viu, fazê-lo regressar... Não, não! Isso não!
Eu tinha passado uma das mãos entre os varões para acariciar o Banco lustroso do animal. Mas ele, puxando-me para trás, disse com ar grave:
- Não se fie, pelo amor de Deus! Porque eu tomo liberdades com ele, isso não prova que toda a gente o possa fazer. As suas amizades são exclusivas... não é verdade, Tommy? Ah, acabou de ouvir a chegada do jantar. É você, rapaz?
Ao longo do corredor, os passos ecoavam no lajedo.
O animal tinha-se endireitado, andava de um lado para o outro na estreita jaula; as pupilas dardejavam fulgores selváticos; a língua vermelha estalava contra a alvura acerada dos dentes. O servente entrou: trazia numa gamela um quarto de carne grosseiramente esquartejada, que lhe atirou através dos varões.