Amor de Perdição - Cap. 21: Capítulo 21 Pág. 136 / 145

Ao escurecer, voltou de terra o comandante, e contemplou, com os olhos embaciados de lágrimas, o desterrado, que contemplava as primeiras estrelas iminentes ao mirante.

– Procura-a no Céu? – disse o nauta.

– Se a procuro no Céu!… – repetiu maquinalmente Simão.

– Sim… No Céu deve ela estar.

– Quem, senhor?

– Teresa.

– Teresa!… Morreu?!

– Morreu, além, no mirante, donde ela estava acenando.

Simão curvou-se sobre a amurada, e fitou os olhos na torrente. O comandante lançou-lhe os braços e disse:

– Coragem, grande desgraçado, coragem! Os homens do mar também crêem em Deus! Espere que o Céu se abra para si pelas súplicas daquele anjo!

Mariana estava um passo atrás de Simão, e tinha as mãos erguidas.

– Acabou-se tudo!... – murmurou Simão – Eis-me livre… para a morte… Senhor comandante – continuou ele energicamente –, eu não me suicido. Pode deixar-me.

– Peço-lhe que se recolha à câmara. O seu beliche está ao pé do meu.

– É obrigatório recolher-me?

– Para vossa senhoria não há obrigações; há rogos: peço-lho, não mando.

– Vou, e agradeço a compaixão.

Mariana seguiu-o com aquele olhar quebrado e mavioso do Jau, quando o poeta desembarcava, segundo a ideia apaixonada do cantor de Camões.

Encarou nela Simão, e disse ao comandante:

– E esta infeliz?

– Que o siga… – respondeu o compassivo homem do mar, que cria em Deus.

Simão recolheu-se ao beliche, e o comandante sentou-se em frente dele, e Mariana ficou no escuro da câmara a chorar.

– Fale, senhor Simão! – disse o comandante – desafogue e chore.

– Chorei, senhor!

– Eu não tinha imaginado uma angústia igual à sua. A invenção humana não criou ainda um quadro tão atroz. Arrepiam-se-me os cabelos, e tenho visto espectáculos horríveis na terra e no mar.

Acintemente, o comandante estava provocando Simão ao desabafo. Não respondia o condenado. Ouvia os soluços de Mariana, e tinha os olhos postos no maço das cartas, que pusera sobre uma banqueta.





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