Amor de Perdição - Cap. 7: Capítulo 7 Pág. 43 / 145

O perseguido, quando tal ouviu, tirou do maior perigo coragem para fugir, rompendo a espessura e saltando a parede da tapada para o campo de restolho em que o arrieiro andava apanhando palha, e Simão esperava o desfecho da montaria. Correram a um tempo o arrieiro e o académico sobre ele. O fugitivo, sentindo-se alcançado, lançou-se de joelhos e mãos erguidas, pedindo perdão, e dizendo que o amo o obrigara àquela desgraça. Já a coronha do bacamarte do arrieiro lhe ia direita ao peito, quando Simão lhe reteve o braço.

– Não se bate assim num homem ajoelhado! – disse o moço – Levanta-te, rapaz!

– Eu não posso, senhor. Tenho uma perna quebrada, e estou aleijado para a minha vida! Neste comenos, chegou o ferrador, e exclamou:

– Pois esse tratante ainda está vivo!

E correu sobre ele com o podão.

– Não mate o homem, senhor João! – disse o filho do corregedor.

– Que o não mate! Essa é de cabo-de-esquadra! Com que então o fidalgo quer pagar-me com a forca o favor de o acompanhar… hem?

– Com a forca!? – atalhou Simão.

– Pudera não! Quer que este homem fique para ir contar a história? Acha bonito? Lá vossa senhoria, como é filho de ministro, não terá perigo; mas eu, que sou ferrador, posso contar que desta vez tenho o baraço no pescoço. Não me faz jeito o negócio. Deixe-me cá com o homem…

– Não o mate, senhor João; peço-lhe eu que o deixe ir. Uma testemunha não nos pode fazer mal.

– O quê! – redarguiu o ferrador – Vossa senhoria é doutor, saberá muito, mas de justiça não sabe nada, e há-de perdoar o meu atrevimento. Basta uma só testemunha para guiar a justiça na devassa. Às duas por três, uma testemunha de vista, e quatro de ouvir dizer, com o fidalgo de Castro Daire a mexer os pauzinhos, é forca certa, como dois e dois serem quatro.

– Eu não digo nada; não me matem, que eu nem torno a ir para Castro Daire – exclamou o homem.





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