O Primo Basílio - Cap. 1: CAPÍTULO I Pág. 7 / 414

Jorge enterneceu-se, pôs-lhe sobre as pálpebras dois beijos chilreados. E torcendo-lhe o beicinho, com uma meiguice:

- Queres alguma coisa de fora, amor?

- Que não viesse muito tarde.

Ia deixar uns bilhetes, ia numa tipóia, era um pulo...

E saiu, feliz, cantando com a sua boa voz de barítono:

- Dia dei oro,

Dei mondo signor

La la ra, la ra

Luísa espreguiçou-se. Que seca ter de se ir vestir! Desejaria estar numa banheira de mármore cor-de-rosa, em água tépida, perfumada, e adormecer! O numa rede de seda, com as janelas cerradas, embalar-se, ouvindo música! Sacudiu a chinelinha; esteve a olhar muito amorosamente o seu pé pequeno, branco como leite, com veias azuis, pensando numa infinidade de coisinhas: - em meias de seda que queria comprar, no farnel que faria a Jorge para a jornada, em três guardanapos que a lavadeira perdera...

Tornou a espreguiçar-se. E saltando na ponta do pé descalço, foi buscar ao aparador por detrás de uma compota um livro um pouco enxovalhado, veio estender-se na voltaire, quase deitada, e, com o gesto acariciador e amoroso dos dedos sobre a orelha, começou a ler, toda interessada.

Era a Dama das camélias. Lia muitos romances; tinha uma assinatura, na Baixa, ao mês. Em solteira, aos dezoito anos entusiasmara-se por Walter Scott e pela Escócia; desejara então viver num daqueles castelos escoceses, que têm sobre as ogivas os brasões do clã, mobilados com arcas góticas e troféus de armas, forrados de largas tapeçarias, onde estão bordadas legendas heróicas, que o vento do lago agita e faz viver; e amara Ervandalo, Morton e lvanhoé, ternos e graves, tendo sobre o gorro a pena de águia, presa ao lado pelo cardo de Escócia de esmeraldas e diamantes. Mas agora era o moderno que a cativava: Paris, as suas mobílias, as suas sentimentalidades.





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