O Bobo - Cap. 15: XV - Conclusão Pág. 162 / 191

Entre os dois proferiram-se algumas palavras. Eram baixas e rápidas: ninguém as ouviu; mas deviam ser atrozes. Quase a um tempo o montante de Garcia faiscou batendo no elmo do seu adversário, e a acha de armas de Egas esmigalhou o escudo do aragonês; depois por longo tempo não soou ali senão o restrugir do ferro no ferro, o ranger de dentes, e um rir sumido mas infernal. Riam porque o sangue lhes começava a rever das armaduras rotas e aboladas. Os cavalos arquejavam sob as suas redes de malha, e sob os pesados arneses de seus donos, que em pé nos estribos e apertando- -os entre as duras joelheiras de ferro os faziam bater de peitos um no outro, e misturarem a escuma ensanguentada que lhes cobria os freios e salpicava as crinas. Os pobres animais meneavam-se já a custo, e as forças e o ânimo feroz dos cavaleiros não quebravam, antes pareciam crescer. Quase ao mesmo tempo os ginetes ajoelharam e caíram; mas de um salto os dois adversários ficaram em pé com a espada na mão. Os besteiros e fundeiros que os cercavam tinham cessado de combater, e consideravam com terror aquele espectáculo, como se uma voz de cima lhes houvera dito que esse combate era um repto de morte. Dava-lho, porém, a conhecer um tremendo sinal: ambos destros no pelejar, nenhum curava de resguardar- se dos golpes do seu adversário, atento só a feri-lo. Naquelas almas repassadas de furor, dos dois pensamentos de vida e de morte, não cabia senão um, e era ao segundo que ambos exclusivamente se abandonavam.

Por fim o cavaleiro de Riba de Douro começou a levar visivelmente a melhoria ao generoso alferes-mor. Este não previra o recontro que o aguardava: o ódio de Egas havia, porém, calculado placidamente tudo.





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