O Bobo - Cap. 16: Apêndice Pág. 183 / 191

Mas os quatro dentre o bando vencido que haviam ficado firmes na sela tinham imediatamente posto pé em terra e desembainhado as espadas. Quatro do lado oposto desceram a recebê-los, mas os portugueses abaixaram as espadas.

– Todos, todos! – bradou com voz trémula de cólera o que dentre eles mais rapidamente pusera o pé em terra.

A multidão acolheu este brado com um dilúvio de palmas.

Aquele dia tinha de ser um dia de grande glória para os alvazis de Guimarães. Havia nos antigos torneios, bem como nos desafios judiciais, chamados juízos de Deus, dois juízes do campo destinados a dirimir as contendas e dúvidas que se alevantavam acerca das fases da luta. Nas lides judiciais dos concelhos os alvazis ou alcaides cumulavam essas funções com as do julgamento dos pleitos cíveis. Mas juízes do campo em torneio de nobres era honraria, que ultrapassava a meta das mais desvairadas ambições de um cavaleiro vilão. E todavia a graciosa rainha-infanta e o seu valido e primeiro rico-homem de Portugal, Fernando Peres, tinham resolvido que naquele dia os privilégios dos filhos-d’algo cedessem ante os privilégios dos magistrados do seu bom e leal burgo de Guimarães, que pagava as despesas da festa.

Como modernamente, já naqueles tempos não esquecia nunca aos príncipes adicionar o epíteto de leal a qualquer povoação onde se manifestavam sintomas de iminente rebelião.

Os aplausos com que foi acolhido o desigual repto lançado pelo bando vencido ao vencedor eram mais um desses sintomas que o burgo de Guimarães dava, havia muito, da sua malevolência contra uma corte de estrangeiros, onde um estrangeiro fazia na aparência o segundo papel e na realidade o primeiro.

Os juízes desceram do seu trono burguês, atravessaram pausadamente a liça e aproximaram-se dos combatentes.





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