O Bobo - Cap. 4: IV - Receios e esperanças Pág. 34 / 191

Dom Bibas fez uma segunda visagem ao reverendo Martim Eicha, rodeou o capitel, e desceu rapidamente por entre os colunelos. Daí a pouco a sua voz esganiçada ouvia-se no outro extremo da sala de armas.

O inesperado da jogralidade do bufão tinha feito desatar a rir o Lidador e o abade. Não assim o honrado cónego de Lamego, a quem as alusões insolentes espalhadas naquela trova satírica haviam mortificado ao vivo. A cólera fugira da alma do cavaleiro; mas fora reconcentrar-se na do sacerdote. Nunca Dom Bibas ousara tanto: o fogo da revolta lavrava já no espírito de um vil bobo! O bom do capelão agarrou-se a este pensamento para cerrar os ouvidos à voz da consciência que lhe dizia terem batido no alvo os motejos cruéis do chocarreiro. Assim, com meneios entre hipócritas e altivos, afastou- se dos dois sem os saudar, e desapareceu no meio da turba dos cavaleiros, jurando pela pele a Dom Bibas, e prometendo relatar ao conde de Trava, nessa mesma noite se pudesse, todas as circunstâncias daquela conversação.

A hora, porém, a que o sarau devia acabar soou. A bela infanta estremeceu ao ouvi-la bater na campa da torre albarrã. Sentiu alargar-se a mão de ferro que lhe apertava o coração; a íntima agonia, que a política do conde lhe obrigava a velar sob o aspecto mentido do contentamento, poderia afinal dilatar-se na soledade em torrentes de lágrimas. Encostada ao braço de Fernando Peres, e seguida das suas donzelas, D. Teresa atravessou os aposentos imediatos e recolheu-se à sua câmara. Os ricos-homens e filhos de algo começaram a sair, e pouco a pouco a sala ficou deserta.





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