- Não, senhor; já lhe disse; não pode ser.
- Ah! senhor! - bradou de dentro a voz rouca e alquebrada do enfermo. - Quem quer que está aí, pelo amor de Deus, entre cá dentro.
- Está ouvindo? - disse Elias, ele me chama; abra essa porta.
- Não, não pode ser; quantas vezes quer que lhe diga?
E depois voltando-se para dentro e abrindo extraordinariamente os enormes olhos, como rã esbordoada, bradou para o enfermo.
- Ah! velhote de uma figa! não pode calar essa boca?... é assim que pretende sarar?... parece uma criancinha!... pois olhe: se continuar assim, não sei se estarei mais para o aturar... se quer conversar com todo o mundo que passa, mando pôr sua cama lá no meio da estrada, e eles que o aguentem.
- Quem está aí na porta entre cá por caridade; não faça caso do que ela está dizendo; por caridade!... pelas cinco chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo! entre... entre... quanto antes.
- Ai! ai! ai!... - ululou a velha harpia. - Bendito Deus! ainda de mais a mais variado do juízo!
- Mulher infernal, - bradou Elias com força, - abre-me já, se não queres que arrebente a porta.
- Arrebentar! como está bonito o moço! tomara ver isso!... porventura a casa é sua?... moço, vá andando seu caminho, e não esteja tentando a Deus! já lhe disse que não abro.
E dizendo isto bateu com a janela, e trancou-a. Elias entendeu que não devia mais esperdiçar palavras com aquela megera. Meteu o ombro à franzina porta que estava apenas trancada por uma fraca tramela, e que cedeu logo ao primeiro empurrão.
- Misericórdia! - guinchou a velha, - este homem tem o diabo no corpo! Misericórdia! aqui d’El-Rei!
Elias afastou com um empurrão a velha que se apresentara por diante querendo-lhe estorvar a entrada e fazendo uma berraria dos diabos; e foi-se dirigindo rapidamente para a miserável alcova, antes antro, em que jazia o desgraçado velho.