O Crime do Padre Amaro - Cap. 18: Capítulo 18 Pág. 337 / 478

- Homem! disse o cônego sentenciosamente, é o que a gente leva de melhor deste mundo.

- É verdade, padre-mestre, é verdade! É o que a gente leva de melhor deste mundo.

* * *

Desde esse dia Amaro gozou uma completa tranquilidade de alma. Até aí incomodava-o, por vezes, a ideia de que correspondera ingratamente à confiança, aos carinhos que lhe tinham prodigalizado na Rua da Misericórdia. Mas a tácita aprovação do cônego viera tirar-lhe, como ele dizia, aquele espinho da consciência. Porque enfim, o chefe de família, o cavalheiro respeitável, o cabeça - era o cônego. A S. Joaneira era apenas uma concubina... E Amaro mesmo, às vezes agora, em tom de galhofa, tratava o Dias de seu caro sogro.

Outra circunstância viera alegrá-lo: a Totó adoecera de repente: o dia seguinte ao da visita do cônego, passara-o soltando golfadas de sangue: o doutor Cardoso, chamado à pressa, falara de tísica galopante, questão de semanas, caso decidido...

- É destas, meu amigo, tinha ele dito, que é trás... trás... - era a sua maneira de pintar a morte, que, quando tem pressa, conclui o seu trabalho com uma fouçada aqui, outra além.

As manhãs na casa do tio Esguelhas eram agora tranquilas. Amélia e o pároco já não entravam em pontas de pés, tentando esgueirar-se para o prazer, despercebidos da Totó. Batiam com as portas, palravam forte, certos que a Totó estava bem prostrada de febre, sob os lençóis húmidos dos suores constantes. Mas Amélia, por escrúpulo, não deixava de rezar todas as noites uma Salve-Rainha pelas melhoras da Totó. às vezes mesmo ao despir-se, no quarto do sineiro, parava de repente, e fazendo um rostinho triste:

- Ai, filho! Até me parece pecado, nós aqui a gozarmos, e a pobre pequena lá embaixo a lutar com a morte...

Amaro encolhia os ombros. Que lhe haviam eles de fazer, se era a vontade de Deus?...





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