O Primo Basílio - Cap. 10: CAPÍTULO X Pág. 291 / 414

Pensava no tempo tão distante, em que, por melancolia e por sentimentalidade, frequentava mais as igrejas. Ainda a mamã vivia então; e ela com o coração quebrado - quando o outro, Basílio, lhe escrevera, rompendo - procurava dissipar a sua tristeza nas consolações da devoção. Uma amiga sua, a Joana Silveira, fora por esse tempo professar à França; e ela às vezes lembrava-se de partir também, ser irmã de caridade, levantar os feridos nos campos de batalha ou viver na paz de uma cela mística! Que diferente a sua vida teria sido - desta agora tão alvoroçada de cólera e tão carregada de pecado!... Onde estaria? Longe, nalgum mosteiro antigo, entre arvoredos escuros, num vale solitário e contemplativo; na Escócia, talvez, país que ela sempre amara desde as suas leituras de Walter Scott. Podia ser nas verde-negras terras de Lammermoor ou de Glencoe, nalguma velha abadia saxônia. Em redor os montes cobertos de abetos, esbatidos nas névoas, isolam aqueles retiros numa paz funerária; num céu saudoso, as nuvens passam devagar, com recolhimento; nenhum som festivo quebra a meiga taciturnidade das coisas; revoadas de corvos cortam à tarde o ar num vôo triangular. Ali viveria entre as monjas de alta estatura e olhar céltico, filhas de duques normandos ou de lordes de clãs convertidos a Roma; leria livros doces e cheios das coisas do céu; sentada na estreita janela da sua cela, veria passar nas matas baixas os altos paus dos veados, ou pelas tardes vaporosas escutaria o som distante da bagpipe, que vai tristemente tocando o pastor que vem dos vales de Calêndar; e todo o ar estaria cheio do murmúrio choroso e gotejante dos fios de água, que por entre as relvas escuras caem de rocha em rocha!

Ou então seria outra existência mais regalada, no convento pacato de uma boa província portuguesa.





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