- Então? que tal? A mulher? foi a interrogação que acolheu o Taveira.
Mas antes de dar notícia da estreia da Moreli, a dama nova, Taveira reclamou alguma coisa quente. E enterrado numa poltrona junto do fogão, com os sapatos de verniz estendidos para as brasas, respirando o aroma do punch, saboreando uma cigarete, declarou enfim que não tinha sido um fiasco.
- Que ela, a meu ver, é uma insignificância, não tem nada, nem voz, nem escola. Mas, coitada, estava tão atrapalhada, que nos fez pena. Houve indulgência, deram-se-lhe umas palmas... Quando fui ao palco, ela estava contente...
- Vamos a saber, Taveira, que tal é ela? inquiria o marquês.
- Cheia, dizia o Taveira colocando as palavras como pinceladas; alta; muito branca; bons olhos; bons dentes...
- E o pezinho? - E o marquês, já com os olhos acesos, passava devagar a mão pela calva.
Taveira não reparara no pé. Não era amador de pés...
- Quem estava? perguntou Carlos, indolente e bocejando.
- A gente do costume... É verdade, sabes quem tomou a frisa ao lado da tua? Os Gouvarinhos. Lá apareceram hoje...
Carlos não conhecia os Gouvarinhos. Em redor explicaram-lhe: o conde de Gouvarinho, o par do reino, um homem alto, de lunetas, poseur... E a condessa, uma senhora inglesada, de cabelo cor de cenoura, muito bem feita... Enfim, Carlos não conhecia.
Vilaça encontrava o conde no centro progressista, onde ele era uma coluna do partido. Rapaz de talento, segundo o Vilaça. O que o espantava é que ele pudesse ter assim frisa de assinatura, atrapalhado como estava: ainda não havia três meses lhe tinham protestado uma letra de oitocentos mil réis, no tribunal do comércio...
- Um asno, um caloteiro! disse o marquês com nojo.
- Passa-se lá bem, às terças feiras... - disse Taveira, mirando a sua meia de seda.
Depois falou-se do duelo do Azevedo da Opinião com o Sá Nunes, autor d'El-Rei Bolacha, a grande mágica da Rua dos Condes, e ultimamente ministro da marinha: tinham-se tratado furiosamente nos jornais de pulhas e de ladrões: e havia dez intermináveis dias que estavam desafiados e que Lisboa, em pasmaceira, esperava o sangue.