Mas Maria Eduarda não gostou destes amarelos excessivos. Depois impressionou-se, ao reparar num painel antigo, defumado, resultando em negro do fundo de todo aquele ouro - onde apenas se distinguia uma cabeça degolada, lívida, gelada no seu sangue, dentro de um prato de cobre. E para maior excentricidade, a um canto, de cima de uma coluna de carvalho, uma enorme coruja empalhada fixava no leito de amor, com um ar de meditação sinistra, os seus dois olhos redondos e agourentos... Maria Eduarda achava impossível ter ali sonhos suaves.
Carlos agarrou logo na coluna e no mocho, atirou-os para um canto do corredor; e propôs-lhe mudar aqueles brocados, forrar a alcova de um cetim cor-de-rosa e risonho.
- Não, venho-me a acostumar a todos esses duros... Somente aquele quadro, com a cabeça, e com o sangue... Jesus, que horror!
- Reparando bem, disse Carlos, creio que é o nosso velho amigo S. João Baptista.
Para desfazer essa impressão desconsolada levou-a ao salão nobre, onde Craft concentrara as suas preciosidades. Maria Eduarda, porém, ainda descontente, achou-lhe um ar atulhado e frio de museu.
- É para ver de pé, e de passagem... Não se pode ficar aqui sentado, a conversar.
- Mas esta é matéria-prima! exclamou Carlos. Com isto depois faz-se uma sala adorável... Para que serve o nosso génio decorativo?... Olhe o armário, veja que centro! Que beleza!