Os Maias - Cap. 14: Capítulo 14 Pág. 413 / 630

- Fica agora em Lisboa? perguntou-lhe Maria Eduarda.

- Não, minha senhora, só o tempo de cumprir o meu dever de cidadão, subindo duas ou três vezes o Chiado... Depois volto para a relva. Sintra começa a ser interessante para mim, agora que não está ninguém... Sintra, de verão, com burgueses, parece-me um idílio com nódoas de sebo.

Mas Baptista oferecia a Carlos a chartreuse - dizendo que s. Ex.ª não se devia demorar se não tencionava perder o comboio, de propósito. Maria ergueu-se logo para ir dentro pôr o chapéu. E os dois amigos, sós, ficaram um momento calados, enquanto Carlos acendia devagar o charuto.

- Tu quanto tempo te demoras? perguntou por fim o Ega.

- três ou quatro dias. E tu não voltes para Sintra antes que eu chegue, precisamos comunicar... Que diabo tens tu feito lá?

O outro encolheu os ombros.

- Tenho sorvido ar puro, colhido florinhas, murmurado de vez em quando «que lindo que isto é!» etc.

Depois, debruçado sobre a mesa, picando com um palito uma azeitona:

- De resto, nada... O Dâmaso lá está! Sempre com a Cohen, como te mandei dizer... Está claro que não há nada entre eles, aquilo é só para mim, para me irritar... É um canalha aquele Dâmaso! Eu só quero um pretexto. Esgano-o!

Deu um puxão forte aos punhos, com uma cor de cólera no rosto queimado:

- Eu, está claro, falo-lhe, aperto-lhe a mão, chamo-lhe «amigo Dâmaso», etc. Mas só quero um pretexto! É necessário aniquilar aquele animal. É um dever de moralidade, de asseio publico, de gosto varrer aquela bola de lama humana!

- Quem esteve por lá mais? perguntou Carlos.

- Que te interesse?... A Gouvarinho. Mas vi-a uma só vez. Aparecia pouco, coitada, agora que andava de luto.

- De luto?

- Por ti.

Calou-se. Maria entrava, com o véu descido, acabando de apertar as luvas. Então Carlos, suspirando, resignado, estendeu os braços ao Baptista para ele lhe vestir um casaco leve de jornada. Ega ajudava, pedindo um abraço filial para Afonso, e recados para o gordo Sequeira.





Os capítulos deste livro