O Dia em que o Mundo Acabou - Cap. 3: Capítulo 3 Pág. 38 / 72

- Há uma casa a arder - disse Challenger, por fim, apontando para uma coluna de fumo que se erguia acima das árvores. - Suponho que haverá muitas mais... possivelmente, cidades inteiras em chamas... quando pensamos em quantas pessoas poderão ter caído com luzes nas mãos. O facto da combustão é em si mesmo suficiente para mostrar que a proporção de oxigénio na atmosfera é normal, e que é o éter que tem defeito. Ah, ali está outro foco de incêndio no topo da Colina Crowborough. Se não me engano, é no clubhouse do golfe. O relógio da igreja está a dar as horas. Os nossos filósofos gostariam de saber que o mecanismo feito pelos homens sobreviveu à raça que o fez.

- Caramba! - exclamou Lorde John, e ergueu-se, excitado, da sua cadeira. - Que é aquela baforada de fumo? É um comboio.

Ouvimos o seu ruído, e naquele instante ele apareceu aos nossos olhos, a avançar àquela que me pareceu ser uma velocidade prodigiosa. De onde tinha vindo, que distância tinha percorrido, não tínhamos meios de saber. Apenas por um milagre de sorte teria podido percorrer qualquer distância.

Mas agora íamos assistir ao fim terrível da sua carreira. Um comboio de mercadorias com vagões carregados de carvão estava parado, imóvel, na linha. Contivemos a respiração ao ver o expresso a avançar na mesma linha. O choque foi horrível. Locomotiva e carruagens empilharam-se num monte de madeira desfeita e ferros torcidos. Chispas vermelhas de chamas cintilaram nos destroços até estar tudo a arder. Durante meia hora estivemos sentados praticamente sem proferir uma única palavra, aturdidos com aquele espectáculo aterrador.

- Pobres, pobres pessoas! - exclamou a Sr.ª Challenger, por fim, chorando no braço do marido.

- Minha querida, os passageiros daquele comboio já não estavam mais vivos do que aqueles carvões contra os quais chocaram, nem do que o carbono em que agora se transformaram - disse Challenger, acariciando-lhe a mão para a acalmar. - Era um comboio de vivos quando partiu de Victoria, mas foi conduzido e ocupado por mortos muito antes de ir ao encontro do seu destino.

- Deve estar a acontecer a mesma coisa em todo o mundo - disse eu, quando uma visão de estranhos acontecimentos se ergueu diante de mim. - Pensem nos navios no mar... como o vapor os fará continuar a navegar, até as fornalhas arrefecerem, ou até entrarem a toda a velocidade por uma praia. Os veleiros também... como andarão de um lado para o outro com a sua carga de marinheiros mortos, enquanto as suas madeiras apodrecem e as suas juntas deixam entrar água, até, um por um, se afundarem abaixo da superfície. Talvez daqui a um século o Atlântico ainda esteja salpicado de velhos navios abandonados à deriva.





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