O Bobo - Cap. 8: VIII - Reconciliação Pág. 78 / 191

– Mas no meio de tantos homens de armas, dos atalaias e vigias que guardam pontes, barbacãs e muralhas, não correrás grande risco?

– Oh! não o receies – interrompeu o cavaleiro. – O ouro e, se for preciso, o ferro nos abrirão caminho até o vau do Madroa. Esperar- -me-ão no bosque os meus homens de armas. Para transpor a barbacã talvez nos baste vestir as esclavinas de romeiros. Ninguém haverá tão ímpio que nos pergunte: «Peregrinos do Santo Sepulcro, para onde é que vós ides?» O romeiro é livre como a ave do céu: respeitam-no o besteiro e o homem de armas; dá-lhe abrigo o vilão sob o seu colmo, o abade no seu mosteiro, o nobre no seu castelo. Quando ouvires cantar lá em baixo junto à torre aquela trova que eu fiz ao despedir-me de ti:

Vai-se o vulto do meu corpo

Mas eu não;

Que a teus pés cá fica morto

O coração;

serei eu que virei arrancar-te destes odiosos paços; e então serás minha, minha para sempre!

– Mas se te descobrirem?... Oh, que é uma ideia terrível…

Neste momento um silvo agudo soou da corredoura contígua ao jardim.

– É Abul-Hassan que me faz sinal – disse o cavaleiro estremecendo. – Devo deixar-te, minha Dulce.

– Já!? – murmurou a donzela.

– Sim – replicou Egas –, para poder sair ainda hoje de Guimarães. Sem isso a tua partida fora amanhã impossível.

Um véu de melancolia cobriu o coração de Dulce. Terror inexplicável se apossara dela, como se houvera de ser aquela a última vez que visse o cavaleiro.





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