A República - Cap. 5: Capítulo 5 Pág. 139 / 290

- Em primeiro lugar, entre esses animais, embora todos sejam de boa raça, não os há que são ou se tornam superiores aos outros?

- Há.

- Ora, queres ter filhotes de todos ou só te interessa ter dos melhores?

- Dos melhores.

- Mas como? Dos mais novos, dos mais velhos ou dos que estão na flor da idade?

- Dos que estão na flor da idade:

- E não achas que, se a procriação não se fizesse assim, a raça dos teus cães e das tuas aves degeneraria muito?

- É verdade.

- Mas qual é a tua opinião a respeito dos cavalos e dos outros animais? O que se passa com eles é diferente?

- Seria absurdo.

- Oh!, oh!, meu caro camarada - exclamei -, de que eminente superioridade deverão ser dotados os nossos chefes, se o mesmo se passar em relação à raça humana!

- Sem dúvida que se passa o mesmo. Mas porque falar assim?

- Porque eles terão necessidade - respondi - de empregar uma grande quantidade de remédios. Ora, um médico medíocre parece-nos bastar quando a doença não exige remédios e é susceptível de ceder à observação de um regime; pelo contrário, quando exige remédios, sabemos que é preciso um médico mais corajoso.

- É verdade. Mas onde pretendes chegar?

- A isto: é possível que os nossos governantes sejam obrigados a utilizar largamente a mentira e o logro para bem dos governados; e já dissemos que semelhantes práticas eram úteis sob a forma de remédios.

- E dissemos uma coisa acertada.

- Ora, essa coisa será muito particularmente acertada, creio eu, no que respeita aos casamentos e à procriação dos filhos. -Como?

- É preciso, segundo os nossos princípios, tornar as relações muito frequentes entre os homens e as mulheres de escol e, pelo contrário, muito raras entre os indivíduos inferiores de um e outro sexo; além disso, é preciso educar os filhos dos primeiros, e não os dos segundos, se quisermos que o rebanho atinja a mais elevada perfeição; e todas estas medidas deverão manter-se secretas, excepto para os magistrados, a fim de que, tanto quanto possível, a discórdia não entre na multidão dos guardas.

-Muito bem.

- Assim, instituiremos festas onde reuniremos noivos e noivas, com acompanhamento de sacrifícios e hinos, que os nossos poetas comporão em honra dos casamentos celebrados. Quanto ao número de casamentos, deixaremos aos magistrados o cuidado de o fixar de modo que mantenham o mesmo número de homens - tendo em conta as perdas causadas pela guerra, as doenças e outros acidentes - e que a nossa cidade, na medida do possível, não aumente nem diminua.





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