»Com efeito, estava presente, dizia ele, quando uma alma perguntou a outra onde estava Ardieu, o Grande. Este Ardieu tinha sido tirano de uma cidade de Panfília mil anos antes dessa época; tinha matado o seu velho pai, o irmão primogénito e cometido, dizia-se, muitas outras acções sacrílegas. Ora a alma interrogada respondeu: «Não veio, não virá nunca a este lugar. Porque, entre outros espectáculos horríveis, vimos este. Quando estávamos perto da abertura e prestes a subir, depois de termos sofrido as nossas penas, vimos subitamente esse Ardieu com outros - a maior parte eram tiranos como ele, mas havia também particulares que se tinham tornado culpados de grandes crimes; julgavam poder subir, mas a abertura recusou-lhes a passagem e mugia sempre que tentava sair um desses homens que se tinham irremediavelmente consagrado ao mal ou que não tinham expiado o suficiente. Então, dizia ele, seres selvagens, de corpo em chamas, que estavam ali perto, ouvindo o mugido, agarraram alguns e levaram-nos; quanto a Ardieu e aos outros, depois de lhes terem ligado as mãos, os pés e a cabeça, derrubaram-nos, esfolaram-nos, depois arrastaram-nos para a berma do caminho e fizeram-nos dobrar sobre giestas espinhosas declarando a todos os que passavam por que motivo os tratavam assim e que iam precipitá-los no Tártaro.» Nesse lugar, acrescentava, tinham sentido muitos terrores de toda a espécie, mas este sobrepunha-se a todos: cada um temia que o mugido se fizesse ouvir no momento em que deveria subir e foi para eles uma viva alegria poderem subir sem que ele rompesse o silêncio. Tais eram, mais ou menos, as penas e os castigos, assim como as recompensas correspondentes.