Contos de Mistério - Cap. 2: O LOTE N° 249
(The lot n. 249) Pág. 42 / 167

Com uma obstinação bovina, Smith deu descanso ao cachimbo e voltou a pegar nos livros. Mas mesmo com a melhor boa vontade do mundo, sentiu francas dificuldades em pensar no que lia. O seu espírito evadia-se constantemente para o vizinho de baixo e para o pequeno mistério do seu apartamento. Reflectiu em seguida sobre a agressão que Hastie lhe contara e no ódio que Bellingham votara, parece, à vítima. As duas ideias misturavam-se-lhe incessantemente na cabeça, como se um laço apertado as unisse. E, no entanto, a suspeita mostrava-se tão vaga, tão imprecisa, que era intraduzível em palavras.

- Que este Bellingham vá para o diabo! - vociferou Smith atirando para longe o seu livro de patologia. - Estragou-me a minha noite de trabalho; esta é já uma razão suficiente para que deixe de ralar-me com a sua pessoa!

Durante dez dias, o estudante de Medicina absorveu-se tão completamente nos estudos que não viu nem ouviu nenhum dos seus vizinhos. Às horas em que Bellingham costumava vir visitá-lo, tinha o cuidado de aferrolhar a porta e, mesmo quando ouvia bater, recusava abrir. Uma tarde, porém, descia a escada e, precisamente na altura em que passava em frente da porta de Bellingham, esta abriu-se por completo; o jovem Monkhouse Lee saiu com os olhos cintilantes e as faces vermelhas de cólera; Bellingham corria atrás dele; o seu gordo rosto doentio tremia com uma paixão desenfreada.

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ARTHUR CONAN DOYLE

CONTOS DE MISTÉRIO

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- Imbecil! - gritou. - Vai arrepender-se!

- Muito provavelmente - respondeu o outro. - Lembre-se do que lhe disse: acabou! Não quero ouvir falar mais nisso!

- Em todo o caso, tinha prometido...

- Oh, fique descansado! Não falarei. Mas preferiria ver a pequena Eva na sepultura.





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