Contos de Mistério - Cap. 4: DE PROFUNDIS
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- Não é nada de importância - disse-me, sorrindo ao observar a minha expressão sobressaltada. -Já tive uma borbulhagem quase tão má como esta...

- Mas não é, nem mais ou menos, uma borbulhagem.

- Não, isto é o efeito de Londres, de respirar o seu ar maléfico. Mas amanhã já terá passado. Levamos a bordo um médico, de maneira que vou em boas mãos. Agora tenho que me ir embora.

- Não vai nada embora - disse eu, obrigando-o a sentar- se numa cadeira. - Isto já passa das marcas. Não se mexe daqui até ser observado por um médico. Espere um pouco.

Enfiei o chapéu, dobrei a esquina a correr até à casa de um médico que vivia ali, e trouxe-o comigo. O quarto encontrava- se vazio e Vansittart desaparecera. Toquei a campainha. O criado disse-me que o cavalheiro em causa tinha pedido uma viatura assim que eu saíra, e partira nela. Deu ordem ao cocheiro para levá-lo ao cais.

- Não parecia doente esse cavalheiro? - perguntei-lhe.

- Doente! - exclamou o criado, sorrindo. - Não, senhor; não parou de cantar nem um momento a plenos pulmões.

Aquele dado não se revelava tão tranquilizador como o criado supunha, mas pensei que teria ido direito ao Eastern Star e como a bordo deste barco levavam médico, não havia que mexer mais no assunto. Não obstante, quando pensei na sede que o devorava, nas mãos ardentes, no olhar sonolento, na conversa destrambelhada e, por último, naquela testa lacerada, levei para a cama uma recordação desagradável do meu visitante e da sua visita.

Às onze da manhã do dia seguinte apresentei-me no cais; mas o Eastern Star tinha navegado rio abaixo e encontrava-se próximo de Gravesend. Fui de comboio para Gravesend, mas apenas cheguei a tempo de avistar ao longe os seus mastros e um penacho de fumo do rebocador que seguia à sua frente.





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