Eneida - Cap. 1: A Queda de Tróia Pág. 13 / 235

Assim falando, ajudou o ancião a subir os degraus e sentou-se no lugar sagrado. Eis, porém, que Polites entrou no pátio. Era um de seus filhos, ferido, fugindo do ferro implacável de Pirro, que o seguia nos calcanhares. Ali mesmo o alcançou e, na frente dos pais, enterrou-lhe a lança, prostrando-o sem vida.

Sentindo-se à beira da morte, Príamo não se conteve e, encolerizado pela brutalidade da cena, exclamou:

— Por esse crime, que os deuses — se alguma justiça existe no céu que se importe com tais acções — te dêem o merecido prémio, a ti, que me fizeste ver a morte do meu filho! No entanto, aquele Aquiles — de quem falsamente te dizes filho — assim não procedeu para com o inimigo Príamo, pois, aceitando os direitos e a lealdade de um suplicante, me devolveu, a mim, o pai, o corpo do meu querido filho Heitor, para que lhe desse uma sepultura condigna.

Assim dizendo, lançou, com fracas forças, o seu dardo contra Pirro. Este apenas levantou o escudo, recebendo o impacto do ferro no bronze redondo, e exclamou:

— Contarás, pois, essas coisas e irás como mensageiro a meu pai, ao filho de Peleu. Não esqueças de contar-lhe que eu, seu filho, estou degenerado. E agora morre.

Agarrou então o velho rei pelos cabelos brancos com a mão esquerda ainda tinta do sangue do filho, arrastou-o até o altar e, levantando a espada cintilante, cravou-a até os copos na ilharga do ancião. Assim morreu Príamo, cujo corpo, degolado, jaz anónimo nas praias de Tróia, outrora poderosa e dominadora.
Eneias, chegando pouco depois e vendo o morticínio, ficou transido de horror e de tristeza. Estava agora sozinho. Os seus poucos companheiros ou estavam mortos ou se tinham separado, esgotados do esforço da luta. Vagando sem rumo pelos grandes salões do palácio, em tudo via as marcas do sangue e da morte. Veio-lhe então à lembrança a imagem do seu querido pai, da esposa Creusa, abandonada, a casa saqueada e o perigo que corria o seu filhinho Ascânio.





Os capítulos deste livro