Eneida - Cap. 9: Os troianos são Cercados Pág. 171 / 235

Lico, no entanto, muito mais ágil na corrida do que o companheiro, fugiu por entre os golpes que lhe eram vibrados de toda a parte e, alcançando os muros amigos, tentou alcançar as altas ameias de onde os companheiros lhe estendiam as mãos. Mas Turno perseguia-o nos calcanhares e trespassou-o com o dardo, gritando:

— Acaso esperaste, insensato, poder escapar às minhas mãos?

E arrancou-o da muralha onde estava seguro, tal qual a águia de Júpiter que, cortando os ares elevados, empolga com as garras aduncas uma lebre ou um cisne de penas brancas. Por todos os lados se levantou um gigantesco clamor de aplauso ao feito e os atacantes lançaram-se ao assalto com redobrado vigor, invadindo e entulhando os fossos com montões de terra ou arrojando setas inflamadas contra os torreões.

Dizem que foi nessa batalha que Ascânio, pela primeira vez, entesou o arco e lançou a sua seta ligeira contra o inimigo e não contra as feras como o fizera até então. O destino do ferro alado do filho de Eneias foi Numano, de sobrenome Rémulo, e que há pouco tempo se casara com a irmã mais nova de Turno. Avançando na primeira fileira, o jovem rótulo bradava aos troianos frases dignas e indignas de referência, o peito arrogante pelo consórcio recente. Dizia:

— Não vos envergonhais de estar encarcerados de novo num cerco e numa paliçada, ó frígios, duas vezes derrotados? São estes os heróis que querem desposar as nossas donzelas? Que deus, que loucura vos trouxe ao Lácio? Não é esta a Grécia, nem aqui está Ulisses. Raça dura desde o tronco, assim que as nossas crianças nascem, levamo-las aos rios e enrijarmo-las no contacto com a água gélida e corrente. Desde meninos que se dedicam à caça e a percorrer as solvas. O nosso desporto e divertimento é domar potros e atirar com arco e flecha. Os moços cultivam a terra e são acostumados a viver com pouco ou então pegam em armas e vão-se à guerra. Toda a nossa vida se passa no manejo das armas. Nem a velhice nos debilita as forças ou alquebra os ânimos. Escondemos os cabelos brancos com os capacetes e apraz-nos trazer presas recentes e viver dos despojos conquistados.





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