Eneida - Cap. 4: Eneias e Dido Pág. 61 / 235

Vénus concordou, rindo do astucioso plano da rainha do Céu.

Surgiu no dia seguinte a linda aurora, deixando o seu leito no oceano, e já saiam os caçadores pelos portões da cidade, a cavalo, com as redes e lanças de ponta larga A matilha de cães de fino faro seguia-os, rápida. Enquanto isso, os lordes e príncipes cartagineses esperavam a rainha às portas do palácio. Ela demorava-se a levantar do leito e o seu corcel, ricamente ajaezado de ouro e púrpura, mordia os freios espumantes e batia as ferraduras reluzentes. Finalmente, apareceu Dido, seguida de grande séquito, radiante de beleza e magnífica no andar — mulher incomparável — com a sua túnica purpúrea bordada a ouro. Trazia aljava também de ouro e os seus cabelos estavam atados de fitas do mesmo metal precioso.

Também de ouro, uma maravilhosa fivela prendia-lhe a túnica. E todos seguiram contentes e animados, cartagineses, troianos, o menino Ascânio e o próprio Eneias, mais garboso que nunca. Tal qual Apolo quando, deixando a sua moradia de Inverno, vem visitar a mãe em Delfos, onde as multidões devotas, numa mistura de cretenses, dríopes e agatirsos, se reúnem em torno dos altares, enquanto o próprio deus avança pelos cumes dos montes, linda coroa a prender-lhe os cabelos dourados e as setas retinindo na aljava ao ombro, assim caminhava Eneias, garboso, imponente e belo.

Chegaram as encostas dos montes, onde a floresta é quase impenetrável e viram cabritos monteses, pulando e correndo pelos rochedos. De um outro lado, veados atravessavam em bandos os campos e levantavam nuvens de poeira na fuga pelos montes perigosos. Ascânio, ousado e atrevido na sua juventude, deliciava-se no seu fogoso cavalo, ultrapassando ora estes ora aqueles — desejando que lhe aparecesse à frente um javali espumante ou um fulvo leão.

Entretanto, começava a baixar do céu um rumor crescente. Surgiu uma nuvem que, despejando granizo, se abateu sobre eles. Todos — tírios, dardanios e o menino Ascânio — se espalharam por toda a parte, à procura de abrigo. Das montanhas, precipitavam-se torrentes de água.





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