Eneida - Cap. 5: Os Jogos Fúnebres Pág. 81 / 235

Assim tendo falado, Eneias cingiu a cabeça com os sagrados ramos de murta. Hélimo imitou-o, o mesmo fazendo Acestes, já mais maduro de idade, o jovem Ascânio e o resto da juventude troiana. Da assembleia, milhares de pessoas lideradas por Eneias dirigiram-se para o túmulo. Ali oferecendo a Baco, segundo o ritual, dois copos cheios de vinho puro, verteu-os no chão, o mesmo fazendo com duas taças de leite fresco e duas de sangue sagrado. Lançando flores de púrpura sobre a rumba assim falou:

— Salve, pela segunda vez, ó santo pai. Salve, cinzas, espírito e sombras paternas, que a ti não te permitiram os deuses acompanhar-nos aos territórios do Lácio.

Mal tinha pronunciado essas palavras quando, debaixo dos altares, surgiu uma grande serpente que continuou pacificamente o seu caminho, boleando em torno do túmulo. O seu dorso era marchetado de manchas azuladas e um brilho mosqueado de ouro inflamava-lhe as escamas, como nas nuvens o arco-íris emite mil reflexos coloridos quando o Sol se lhe opõe. Ante os olhares estarrecidos de Eneias e dos outros, o réptil seguiu a sua marcha para, finalmente, e enrolando os longos anéis nas taças e nos pratos, provar das iguarias e beber do vinho sagrado. Satisfeita, a cobra retirou-se para o seu refúgio sob os altares. Prosseguiram todos nos sacrifícios e rituais sem saber se o animal encarnava algum génio local ou o espírito do próprio Anquises. Mataram cinco ovelhas, cinco porcos e cinco bezerros negrejantes, tudo segundo o costume e de novo derramaram vinho e invocaram os manes do pai de Eneias. Oferendas foram sendo empilhadas sobre os altares e, então, acesas as fogueiras, assaram e comeram a carne dos animais abatidos.

Mas chegou finalmente o nono dia e a aurora já brilhava sobre o mar calmo num céu sem nuvens. A fama e o nome ilustre de Acestes atraíram muitos habitantes das regiões circunvizinhas que enchiam as praias para assistir aos jogos e alguns para neles tomar parte, disputando com os troianos os cobiçados troféus. Estes foram expostos à vista de todos, antes de iniciado o certame, sobre trípodes sagradas. Eram coroas verdes e palmas para os vencedores, armas cobertas de púrpura, moedas de ouro e de prata e muitas outras coisas valiosas. Mas do alto dum cômoro, uma trombeta anunciava já que as pugnas iam começar.





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