O Bobo - Cap. 13: XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais Pág. 126 / 191

– Antes disso, cavaleiro – replicou o conde, em cujo rosto transparecia a luta que tinha consigo mesmo para conter o furor que lhe cintilava nos olhos –, antes disso cumpre advertir-vos uma cousa. Conheço-vos: de sobejo vos conheço eu! Mas não basta vosso simples testemunho e vosso ar altivo para vos crermos mensageiro do mancebo Afonso Henriques, que se intitula senhor e infante de Portugal; mensageiro dos ricos-homens, infanções e concelhos que dizeis vos enviaram. Quem pode afirmar que um homem é o que parece? Muitas vezes motivo oculto obriga o cavaleiro a vestir as bragas de almáfega e o zorame de burel do peão; muitas vezes o vilão ousa trajar o saio escudado de cavaleiro, e pôr sobre a cabeça o capelo de ouropel. Para responder ao que dissestes, por mercê mostrai-me a vossa carta de crença.

Estas palavras do conde foram vibradas com um sorrir tão desusado que o trovador precisou de toda a energia de que naturalmente era dotado para disfarçar a impressão que na sua alma elas haviam produzido. Eram demasiado claras para não as entender. Teria sido atraiçoado por Abul-Hassan? Tremeu ao pensar em Dulce. Sem replicar tirou do peitilho do saio um pequeno pergaminho dobrado e apresentou-o ao conde, o qual o passou às mãos do reverendo Martim Eicha, que exercitava então o ofício de chanceler.

– Em termos, e sem dúvida – murmurou o digno cónego examinando a escritura. – Nada falta: sinais, notário e testemunhas.

– De quem são os sinais? – perguntou Fernando Peres, sem tirar os olhos do cavaleiro, cada vez mais perturbado.





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