O Bobo - Cap. 13: XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais Pág. 128 / 191

Durante a leitura do reverendo cónego de Lamego a perturbação de Egas se havia asserenado com as observações violentas do filho de Pedro Froilaz, que pouco a pouco a tinham convertido em indignação. Esta subira de ponto com as suas derradeiras palavras: o cavaleiro conteve-se todavia.

– Senhor conde de Trava, não creio digno de um nobre homem de Espanha gastar afrontas inúteis contra os que não podem responder- vos. Pedistes-me as provas do que afirmava. Dei-vo-las. O recusar admitir-me à presença da rainha podeis fazê-lo; mas faltareis à lealdade que deveis a vossa senhora.

– E quem te deu direito, miserável, de me ensinar meus deveres? – bradou o conde furioso. – Quem te assegura, vil toupeira que minas no silêncio da noite o chão que pisamos, porque não ousas mostrar à luz do dia a fronte covarde, que sairás a salvo de Guimarães sem que te faça arrancar a língua insolente? Tu, que ousas falar de lealdade, a que vieste ontem a este castelo como um salteador nocturno? Mas ontem como hoje os teus passos foram perdidos! A minha resposta aos conselhos que me dás é esta: servirá ao mesmo tempo de resposta aos que te enviaram.

Ao ouvir as últimas frases, o trovador sentiu fustigarem-lhe as faces os fragmentos do pergaminho, que o conde despedaçara entre as mãos.

O lume fugiu dos olhos a Egas. Era uma afronta monstruosa a que recebera. Recuou: os dentes rangiam-lhe como em acesso febril.

– Infame e covarde és tu, vilão de Galiza! – gritou ele. – Infame porque vendeste o teu corpo como uma mulher perdida; covarde porque só sabes injuriar no meio destes lebréus esfaimados que te cercam. Salteador és tu que roubas a nobre terra de Portugal a seu verdadeiro senhor. Assassino, levanta esse guante se ousas!

E atirou a luva aos pés de Fernando Peres.





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