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Capítulo 1: I - Introdução

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Dispersa, possuindo a terra por títulos de diversas espécies, todos mais ou menos opressivos e precários, na dependência do poderoso imunista, ou do inexorável agente do fisco, a população rural, ainda parcialmente adscrita à gleba, quase que às vezes se confundia com os sarracenos, mouros ou moçárabes, cativos nas frequentes correrias dos Leoneses, e cuja situação se assemelhava à dos escravos negros da América, ou a cousa ainda pior, dada a rudeza e ferocidade dos homens daquele tempo. A burguesia (burgenses), embrião da moderna classe média, assaz forte para se defender ou, pelo menos, opor à opressão a vingança tumultuária, era impotente para exercer acção eficaz na sociedade geral. Veio isso mais tarde. Assim, o único poder que assegurava a unidade política era o poder do rei. A monarquia ovetense-leonesa fora como uma restauração da monarquia visigótica, entre todos os estados bárbaros a mais semelhante na índole e na acção ao cesarismo romano. Uma série de príncipes, senão distintos pelo génio, como Carlos Magno, todavia de valor e de energia não vulgares, tinha sabido manter a supremacia real, anulada gradualmente além dos Pirenéus pela sucessiva transformação das funções públicas em benefícios e dos benefícios em feudos. Entretanto à autoridade central faltava um arrimo sólido a que se encostasse; faltava-lhe uma classe média, numerosa, rica, inteligente, émula do clero pela sua cultura. Essa classe, como já advertimos, ainda simples embrião, só no século XIII começou a ser uma fraca entidade política, aliás rapidamente desenvolvida e avigorada. Desde aquela época é que a realeza aproveitou mais ou menos a sua aliança para domar as aristocracias secular e eclesiástica, como com o auxílio dela as monarquias de além dos Pirenéus conseguiram tirar ao feudalismo a preponderância, e quase inteiramente o carácter político. Hoje é fácil iludirmo-nos, crendo ver nas revoluções e lutas do Ocidente da Península no decurso dos séculos VIII a XII a anarquia feudal, confundindo esta com a anarquia aristocrática. Não era a jerarquia constituindo uma espécie de famílias militares, de clãs ou tribos artificiais, cujos membros estavam ligados por mútuos direitos e deveres, determinados por um certo modo de fruição de domínio territorial, em que se achava incorporada a soberania com exclusão do poder público. Em vez disto, era o individualismo rebelando-se contra esse poder, contra a unidade, contra o direito. Quando as mãos que retinham o ceptro eram frouxas ou inabilmente violentas, as perturbações tornavam-se não só possíveis, mas, até, fáceis. A febre da anarquia podia ser ardente: o que não havia era a anarquia crónica, a anarquia organizada. Eis as circunstâncias, que, ajudadas pelos desvarios da filha de Afonso VI, converteram o seu reinado num dos mais desastrosos períodos de desordens, de rebeliões e de guerras civis.

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Capa do livro O Bobo
Páginas: 191
Página atual: 4

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Introdução 1
II - Dom Bibas 8
III - O Sarau 18
IV - Receios e esperanças 27
V - A madrugada 38
VI - Como de um homenzinho se faz um homenzarão 45
VII - O homem do zorame 59
VIII - Reconciliação 66
IX - O desafio 80
X - Generosidade 90
XI - O subterrãneo 97
XII - A mensagem 110
XIII - A boa corda de cânave de quatro ramais 123
XIV - Amor e vingança 141
XV - Conclusão 157
Apêndice 173